sábado, 12 de dezembro de 2015

Falta de parlamentares e índios de verdade

Em 116 anos desde a proclamação da República o Brasil só teve um parlamentar indígena: Mario Juruna. Desde então nunca mais foi “Dia do Índio” no parlamento, mas os “caciques” continuam por lá em pé de guerra.

Juruna que no finzinho da década de 70 se tornara conhecido por empunhar um gravador onde registrava as falsas promessas feitas por altos funcionários do governo.  Dizia: “homem branco mente muito!”. E com o passar dos anos parece que a coisa não mudou nada, afinal todos os dias vemos os parlamentos, não só do Congresso Nacional, mas dos estaduais, a exemplo do nosso Amapá, em ações nada republicanas.

Amiúde, as coisas não têm mudado muito de lá pra cá, parlamentares enchem de vergonha os eleitores que lhes confiaram seu bem democrático mais precioso: o voto. E a retribuição vem em forma de “mensalão”, “mensalinho”, “jaraquis” e “jabás”, acompanhados de toda a sorte de balangandãs ligados à má versação do erário divulgados amplamente na mídia.

No caso de Juruna em sua pudica inocência, até que incomodou tanto que acabou eleito deputado federal pelo PDT de Darcy Ribeiro e Leonel Brizola, com mais de 30 mil votos, nas eleições de 1982.

Estando no Congresso; tentaram de todo o jeito ridicularizá-lo e de transformá-lo num bufão. Jô Soares, em seu programa humorístico na Globo, logo criou um índio que mal sabia falar o português para que os telespectadores rissem dele. O general João Baptista de Figueiredo, último presidente militar, foi o primeiro a rosnar contra Juruna, dizendo que o Rio de Janeiro só tinha eleito “índios e cantores de rádio”.

Juruna reagia: “Quem não tem consciência, me trata como objeto, me trata como boneca. E quando eu passo aqui dentro de plenário e alguns companheiros à frente de mim e diz cara emburrada é ridículo. Eu não vim aqui fuxicar com ninguém, eu vim aqui pra trabalhar, pra defender povo, eu vim aqui pra lutar. Eu quero que gente começa a respeitar nome de Juruna”.

Mas não deu outra, o brasileiro não leva a sério quem não tem cara de europeu e fica bem de terno e gravata. Com isso o líder xavante que fora convencido a entrar na política por Darcy Ribeiro, que denunciou a campanha contra o índio-deputado feita sobretudo pela imprensa que achava mais bonito o biótipo do politico empertigado do que do índio parlamentar.

Com certa dose de inocência por não saber como as mazelas do parlamento conseguem enodoar o coração de um homem, Juruna foi massacrado por tentar ser um parlamentar dentro que aquilo que se espera eticamente do cargo. A oposição era tão escancarada que até a imprensa mais respeitável do país (à época), a exemplo do Jornal do Brasil, mantiveram durante anos, uma campanha sistemática de desinformação contra o deputado Mário Juruna, através dos procedimentos mais antiéticos, indignos da sua tradição jornalística.

No dia da sua posse como deputado, em março de 1983, Juruna foi aplaudidíssimo, mais até que Ulysses Guimarães. Decidido a só fazer seu primeiro discurso no Dia do Índio, resolveu falar uns dias antes apenas para reclamar das alfinetadas de Figueiredo. “Estou muito revoltado. Este presidente da República tem que fazer serviço para garantir emprego ao povo brasileiro e não para fazer campanha de calúnia contra as pessoas. Eu sou contra a repressão, contra a violência e também contra a mentira e a sujeira. O presidente não pode falar besteira, que é contra a eleição, que é contra mim, o governo federal quer ganhar eleições em todos os Estados do Brasil, mas ele não vai ganhar a consciência do povo, do homem carecido. O presidente não pode meter o pau em nenhum companheiro, em nenhum deputado. Ele que salve o Brasil”.

No dia 19 de abril, como prometido, subiu à tribuna e voltou à carga, valente, criticando os ministros do governo militar e pedindo sua demissão. Em setembro de 1983, iria além e chamaria os ministros de ladrões. “Todo ministro é a mesma panelinha, é a mesma cabeça. Não tem ministro nenhum que presta. Pra mim todo ministro é corrupto, ladrão, sem vergonha e mau caráter. Não vou dizer que todo ministro é bom, legal e justo. Vou dizer que todo ministro é do mesmo saco que aproveita o suor do povo trabalhador”.


Figueiredo, furioso, chegou a pedir a cassação de Juruna, mas o deputado acabou recebendo apenas uma censura por parte da Mesa. Em 1985, Mário Juruna denunciaria a tentativa de Paulo Maluf de comprar seu voto no colégio eleitoral. Devolveu o dinheiro e votou em Tancredo Neves. Desgostoso com a política após não conseguir se reeleger em 1986, Juruna morreu em 2002, vítima de diabetes. O único índio deputado morreu pobre e esquecido, mas não se vendeu!

Eufemismos de um discurso roto

Eu particularmente acho hipocrisia bancar o bolchevique e viver da sinecura pública como se isso fosse a coisa mais tolerável possível. Mas quando se trata da “new left” ou “esquerda caviar”, ou qualquer eufemismo mais apropriado que se possa utilizar nesses tempos em que ninguém mais sabe o que é oposição ou situação, direita ou esquerda.... Chega mais uma modalidade das muitas façanhas da dita esquerda.

Em uma dessas cenas pitorescas de pose extremista, vê-se como exemplo o esvaziamento do Psol no Amapá. Claro que tudo bem medido e bem pesado já que as ditas “estrelas” que um dia balançaram a bandeira rubra da estrela azarada resolveram aderir a outras constelações, se é que isso pode ser um eufemismo galáctico.

Todavia podemos analisar uns fragmentos da “carta testamento” que o único senador do PSol deixou para seus não tão desconsolados confrades, que pareceram até comemorar bem mais do que carpir a saída do ex-psolista que agora se embala na Rede.

O tal fragmento carregado de eufemismos, parece fazer da figura de linguagem um meio de dizer sem dizer que entre tapas e beijos o partido não sentirá falta de seu ex-filiado, assim como o mesmo parece não ter muita estima pelo que se passou e saudades também não parece sentir, visto que o desabafo quando desnudado das antíteses se torna um verbo não muito polido.

Quando diz que “A partir de hoje deixo de ser um filiado e passo a ser um amigo do partido”. Amigo? De quem mesmo? Pois as alas mais conservadoras nunca viram com bons olhos a associação com os democratas na politica do “fazer para ganhar”. Apenas toleraram até certo ponto da manifestação solitária e velada.

“No entanto, o ambiente político exige uma maior capacidade de articulação política”. Ou seja, depois de dez anos finalmente abriram-lhe os olhos de que seu partido nativo não tinha capacidade de articular absolutamente nada? Chega a ser um contraste gritante com todos os holofotes acesos na tentativa de articular.

“Exige amplitude, exige multiplicidade de relações (...)”. Algo que já era uma realidade de longa data, a capacidade de procurar objetivos cujas relações eram contraproducentes à filosofia que se construiu em cima do partido que deveria ser avesso a tudo o que se pregava na politica vigente do primeiro mandado do PT a frente do Planalto. Mas que na verdade ficou tudo igual, mudou-se apenas a sigla, os maus costumes perduraram.

“(...) para que se construam organizações políticas capazes de atrair jovens, intelectuais, artistas, membros do movimento social, ativistas, militantes das redes sociais”. Surpreendente ver que uma afirmação dessas recai sobre um partido que vive imiscuído entre a juventude, artistas, (BBB também conta!), ativistas e militantes de redes sociais, e de repente foi classificado como obtuso e obsoleto, quase um PDS!

“(...) e todos aqueles que possam abraçar uma agenda comum em defesa do desenvolvimento soberano e sustentável e da superação das desigualdades econômicas e sociais”. Enfim chegamos ao ápice em que o partido que serviu de abrigo e trincheira para amealhar destaque como esquerda, já não tem mais propósito para combater as desigualdades sociais.

O longo discurso enfadonho similar ao de Fidel em seus tempos de tribuna. É o mesmo discursos de esquerda, que manifesta-se contra tudo em tempos em que não se tem mais aqueles cartazes e panfletos com “Fora FHC” ou “Fora FMI”. Já que a esquerda tomou conta do executivo nacional, fornicou e proliferou como larvas no esterco e no fim das quantas e tantas, acabou no mesmo balaio que tanto condenou em discursos e protestos.


No final de tudo é isso que conta, o imediatismo do discurso em detrimento ao que realmente importaria: O Povo! Que pena, mas George Orwell sempre esteve coberto de razão quando deu na telha de dizer que os bichos fazem exatamente as mesmas coisas, sejam; cães, gado, galinha e até mesmo porcos. Independente da espécie, no final da tudo na mesma, só mudam os eufemismos...

Respeitem os cabelos brancos da imprensa

Cada vez que ouço alguém se expressar contra os profissionais da imprensa com todos os adjetivos mais pejorativos possíveis acompanhados por frase chapadas como “fez por merecer” ou “está recebendo algo para escrever isso”, vem aquele aperto no pomo de Adão só de pensar no mau juízo que fazem da mídia na politica do “por um pagam todos”.

Ora, ainda existe espaço para o jornalismo sério no Brasil, não aquele do “mela, mela”, que se resume a simplesmente macular a imagem ou o caráter de um ou outro para simplesmente tascar a pecha disso ou daquilo e toda a sorte de despautérios a fim de amealhar um trocadinho, ou na linguagem do meio “um jabazinho”.

Mas, antes de qualquer coisa, deve-se respeitar a antiguidade dos cronistas sérios, afinal a arte de relatar a humanidade é bem mais velha do que os doutos senhores da lei, pois o homem já retratava sua vida cotidiana nas paredes de cavernas em pinturas rupestres, simplesmente pelo motivo de preservar o fato como registro de sua própria humanidade.

Esses críticos insanos devem mais é curvar-se ante um busto de Ésquilo que retratava a vida em seus textos e com isso, comparar o quão é longevo é o oficio do cronista.  Pois desse ventre nasceu o jornalista moderno; não sem antes pregar sua máxima de retratar o mundo como se vê e eivado de caracteres que possam passar esta impressão ao leitor seja ele contemporâneo ou membro da posteridade.

O desrespeito com que a profissão tem sido tratada é quase como um comparativo ao meretrício, se é que não fui muito longe ao fazer tal baliza, mas é como alguns descrevem os profissionais que todos os dias saem de suas casas para enfrentar um universo de noticias, muitas delas apócrifas, ou sem nenhum valor moral e nem contexto útil ao conhecimento da sociedade. E mesmo assim sobreviverem ao fim da jornada, quando a ultima rotativa começa a dar sinal de que a missão está cumprida.

Ora pois, a maioria ainda tem que se esgueirar em um universo virtual recheado dos ávidos blogueiros e pseudos que fazem de uma gota um oceano para afogar desafetos e por isso receber como um mercenário e não um cronista. Como os antigos tabloides faziam com que fatos corriqueiros da vida social vitoriana se tornassem manchete de capa, assim como tabloides iguais ao The Mirror que ainda ganham o pão desta forma até hoje.

Para os críticos, principalmente aqueles se sentiram prejudicados por não terem sido retratados a contento, um aviso: o universo das noticias não se reserva ao direito de guardar os fatos mais capciosos da vida pública ‘em uma redoma de falsa moral’, se você não concorda com um ponto de vista informado, discorde, esse é um direito que assiste ao mundo livre e democrático.

Mas daí a levantar a voz e a espezinhar em cima do indivíduo e não do fato, isso sim é uma demonstração de o quanto se é obtuso à vida em sociedade. Os jornalistas profissionais sim, vão sempre zelar pelo privado desde que esse não interfira no público, mas com certeza o público é publicável e por mais que se queira ou que doa, ou que magoe; uma coisa a imprensa nunca chegará a ser: Inerte! Como certos poderes que se julgam acima do bem e do mal, mas que no fim de tudo, ainda mantém a síndrome de ‘sepulcro caiado’ bem viva em suas mentes, em seus corações e em seu estilo de vida contraditório.

Pois bem digo, respeitem os cabelos brancos da imprensa! Afinal se você se sentiu atingido é por que em algum momento de sua vida você foi retratado pelos seus méritos ou faltas desde que sejam de interesse público.




Trocar 6 por meia dúzia?

O impeachment da presidente Dilma Roussef, ou de qualquer presidente da República das bananas, ops! Digo, do Brasil. Exige um processo complexo, demorado e pode não produzir o resultado imaginado por muitos brasileiros, e diga-se de passagem os mais a eloquentes a ideia.

Após instaurado o processo de impeachment no Senado, após a admissão da acusação – por denúncia de qualquer brasileiro nato ou naturalizado no gozo de seus direitos políticos -, por dois terços da Câmara dos Deputados, o presidente ficará suspenso das funções pelo prazo máximo de cento e oitenta dias conforme a Constituição Federal.

A vacância do cargo do presidente, pelo impeachment decretado pelo Senado, não leva necessariamente a novas eleições, mas a sucessão pelo vice-presidente da República, no caso Michel Temer (PMDB), conforme prevê o artigo 79 da Constituição Federal. Nesse caso, assumiria em seu lugar, pelo restante do período do mandato, o vice-presidente.

Novas eleições só ocorreriam se também o vice fosse processado e ao final declarado impedido, o que não parece ser o caso. Ocorre que o impeachment é um processo de responsabilização política de natureza pessoal, isto é, como todo processo punitivo, pressupõe imputação por fatos do próprio acusado, não se estendendo a terceiros, salvo os casos de concurso de agentes, ou seja, corréus ou partícipes do mesmo crime.

Assim, embora o vice-presidente não seja diretamente eleito, porque não recebe voto pessoal, assumindo o cargo juntamente com o presidente, não pode ser responsabilizado juridicamente por atos daquele, fora dos casos de coautoria ou participação, como se a sorte de um dependesse da sorte do outro.

É possível ver que o afastamento definitivo da presidente da República - que para muitos é parte importante das mudanças necessárias para o país -, pode ser uma medida muito mais simbólica do que efetiva. Tirar-se-ia dela o protagonismo do comando, mas não os partidos que governam a Nação.

Frente ao conjunto de demandas da sociedade brasileira, notadamente as que dizem respeito à ineficiência dos serviços públicos essenciais e a incapacidade dos órgãos governamentais em oferecer as respostas estruturais de que o Brasil necessita, a demanda pelo impeachment é absorvida e ultrapassada, certamente por se generalizar a consciência de que a causa fundamental dos nossos problemas é de fundo ético; trocar o comandante de uma nau desgovernada pode corrigir o rumo e até evitar o naufrágio, mas não nos levaria a um porto melhor e mais seguro.

A histórica corrupção e a impunidade no Brasil, por sua extensão e falta de limites, é percebida cada vez mais como um problema que afeta a todos, que contamina poderes e instituições de maneira geral. E, à parte explicações de ordem sociológicas (o ingênuo jeitinho brasileiro, o é dando que se recebe), é certo que já não podem ser vencidas com os instrumentos ordinários sob o regime jurídico-político vigente de que se nutre.

Talvez seja o caso de começarmos a indagar: por que o presidente da República deve ter tantos poderes? Por que é tão difícil tirá-lo do cargo? Por que há julgamentos políticos como o impeachment?  Por que devemos ter reeleição? Por que o presidente nunca presta contas ao Congresso? Por que devemos ter tantos senadores e deputados? Por que os partidos políticos devem ter o poder que têm? Por que os partidos políticos não são fiscalizados e punidos? Por que um cidadão não pode eleger-se senão por meio de um partido político? Por que os instrumentos de participação direta do povo, o plebiscito e o referendo quase não são usados?

É claro que essas indagações são apenas exemplificativas. Mas podem ser o começo de uma discussão que deve ir paras as ruas, pois se quisermos mudanças duráveis e efetivas, devemos surpreender os problemas no berço do sistema político, onde são “embaladas” as soluções de que dependem todos os outros subsistemas e poderes.

O povo que vai às ruas, ou seja, a classe média - porque os governos neutralizam as pontas: as elites e as massas; a primeira sente pouco os efeitos da crise, e a segunda é anestesiada pelo assistencialismo -, parece descobrir que o campo político como é o objeto das suas reivindicações.


Mas, vamos convir: Dilma não é Color, as pedaladas fiscais não foram feitas em um Fiat Elba e Michel Temer não é Itamar. E por mais anti-petista que eu seja. Com certeza absoluta, devemos lamber as feridas e aguardar as cenas dos próximos capítulos, pois com certeza nesses tempos de crise intensa, não vislumbro que a criação de uma nova moeda possa mudar o Brasil.

As sete vacas do PT

Qualquer economista por mais incipiente que seja, sabe que oscilações na economia são fator presente em qualquer mercado aberto, seja ele emergente ou não. Talvez Levy e Dilma tenham perdido essa aula por alguma sessão de panfletagem militante.

Por isso, agora todos sofrem com as decisões equivocadas na politica econômica. A comunidade europeia está aí para provar que até o bloco dos mais ricos do velho mundo balançam o açaizeiro de vez em quando, como a Grécia que anda roendo um caroço de pupunha neste momento.

Mas, a derrocada na economia é um fato. Talvez até tão antigo quanto o mundo. Até na Bíblia temos uma narrativa na história de José do Egito, que a terra farta dos faraós passaria bonança e por grandes apertos no o tempo das vacas gordas e magras.

Mas para a administração petista dos últimos 13 anos a lição parece não ter sido aprendida nem no catecismo. Afinal estamos entrando em uma época delicada em que o governo Dilma anuncia um pacote nada popular, mas que não parece se importar com o amanhã, já que não estamos em ano de eleição.

Para equilibrar as finanças federais, o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, e o do Planejamento, Nelson Barbosa, anunciaram mais um grande baque na população brasileira. Um pacote de “apertem os cintos o piloto sumiu” como nunca se viu na história deste país.

Algo dessa magnitude fez com que cada eleitor de Dilma mordesse a ponta da língua de maneira famigerada ou até canibal com o anuncio nada animador do pacote de medidas econômicas. Claro que muito dessas sandices fiscais e cortes até na veia populista de Lula e Cia devem passar pelo congresso, que já não anda muito feliz com o Palácio do Planalto. E ao contrario de Dilma, alguns parlamentares tem ambições ao executivo municipal de seus estados no ano que vem.

Se a intenção é superavitar os cofres do tesouro federal, a fórmula parece ser a mais drástica possível sobre o brasileiro, já que o contribuinte direto e indireto dos impostos será o maior financiador do ambicioso plano anunciado por Levy.

Seria até admissível que se o governo federal anunciasse um pacote impopular desse calibre para dizer a população: “-Olha, tem que ser assim por que se não for não teremos dinheiro para custear os serviços básicos, como educação, saúde e previdência social”, poderia se ter certa complacência.

Mas não é bem assim, pois a justificativa básica que veio junto com o pacote foi de que isso tudo seria para manter a capacidade do governo ter um superávit viável (aquele dinheirinho que se usa para pagar as dívidas do governo internamente) e manter o PIB nada glorioso de menos de 1%.

Como se já não bastasse a justificativa a grosso modo de rapelar o contribuinte para pagar dividas de quem gastou desenfreadamente. Os cortes impactam diretamente no serviço público já que reajuste para o funcionalismo em 2015 nem que vaca tussa! Isso também vale para o ingresso no serviço público, já que uma das medidas é suspender qualquer concurso nesse período.

Mas o drama não para por aí, já que não só os funcionários públicos vão ficar com o pires na mão. Estados e municípios também vão ter muita sudorese já que os cortes impactam no PAC; Minha Casa, Minha Vida; na saúde e nos subsídios à agricultura. Ou seja, é bom baixar a porta larga por que o brasileiro agora vai entrar na era do “se me dão”.

A pessoa física também terá surpresas quando for prestar contas com o leão, já que a proposta milagrosa que parece ter sido escrita com a mesma caneta de Cristina Kirchner com aval de Axel Kicillof, reajusta o IRPS (Imposto sobre o Rendimento de Pessoas Singulares) que atualmente está com teto progressivo até 15% pode chegar até insustentáveis 18%. Parece pouco, mas é quase 1/5 do que uma pessoa recebe de rendimentos, faça as contas: de cada 30 dias trabalhados 6 você devolve só em impostos diretos retidos na fonte, fora os impostos indiretos sobre produtos de consumo e serviços.

Isso sem falar das tendências milagrosas de Dilma e Levy que num ato messiânico devem ressuscitar a CPMF (Contribuição Provisória sobre as Movimentações Financeiras) que era apelidado de ‘imposto sobre o cheque’ e tinha a finalidade de capitalizar a saúde, mas no final da quantas acabou servindo para engordar os cofres da união e proporcionar a gastança que levou a tudo isso que vemos hoje e agora volta para ratear a divida do governo federal entre todos os brasileiros.


Como o leite já está derramado, de nada adianta a equipe econômica tentar aprender alguma coisa com a história de José do Egito e as suas vacas magras e gordas. O jeito agora é Dilma por o véu de carpideira, colocar o evangelho debaixo do braço e torcer para que não estejamos vivendo o princípio do Apocalipse, já que as bestas (no sentido de otário mesmo!) estão soltas e prontas para contribuir com os impostos.

O feijão e o sonho

Não, não!

Não pense que estou plagiando o título do romance de Orígenes Lessa, por que o feijão deste desabafo não tem nada de literário e quiçá predispõem-se a tentar salvar a ultima migalha de moral que o brasileiro ainda deve ter depois de entender por onde anda aquela piada que se diz muito no norte, “de fazer filho na mulher alheia”.

Acontece que em plena crise econômica, com uma safra de grãos meio que prejudicada, nesses tempos bicudos em que os subsídios à agricultura foram cortados quase que no talo do erário e as medidas protecionistas à agricultura e investimentos no setor de agronegócio meio que broxando a olhos vistos.

O Governo Federal resolve fazer mais uma daquelas “ações humanitárias” para tentar exportar a indústria da miséria para fora das fronteiras brasilianas. Como por exemplo, enviar 625 toneladas de feijão para... O Nordeste? Não, não meu amigo. Para Havana, para Cuba!

Esse mimo para Raul e a prole dos Castro, vai a título de ajuda humanitária, inclusive amparada por uma lei dos tempos do “nunca dantes na história deste pais...”

Mas, ajuda humanitária; deve-se perguntar o incauto leitor e contribuinte brasileiro que deve voltar a contribuir involuntariamente a partir de 2016 se as medidas de Dilma passarem no congresso: Ajuda humanitária por que?

Qual terremoto, tsunami, calamidade ou êxodo islâmico assolou a ilha caribenha de tal maneira que o governo brasileiro tenha que ser tão solícito na feijoada dos cubanos enquanto nossos índices de miséria não foram zerados e mais de sete milhões de brasileiros ainda não tem o que comer em uma refeição diária?

Esse é o Brasil da estrela, onde para se fazer um gesto se gasta mundos e fundos para parecer uma potencia mundial ou um líder de um bloco e tem-se atrás do balcão um cesto de roupa suja de petróleo ainda quente e mal resolvido para lavar.

Hão de me questionar, ah você se pega a picuinhas, é só um feijãozinho de nada! Mas vamos botar na ponta do lápis que a ilha dos Castro tem cada vez mais se tornado um departamento ultramarino do Brasil. Afinal construímos Mariel para os cubanos, demos-lhes um porto de primeiro mundo sendo que nem no Brasil temos igual.

Mas apesar dessa generosidade do governo Lula que nos custou R$ 1 bi ao BNDES e a fundo perdido, diga-se de passagem, (não precisa pagar de volta!). E então o que acontece? Os EUA param de fazer beicinho com Cuba, acaba o embargo comercial. Rússia e EUA voltam a fazer amor em terras cubanas e o Brasil pagou o motel em Mariel!

Esse é o nosso costume, pagar a conta para os outros, assim foi com Mariel, assim será com a feijoada que a CONAB está transferindo para Havana, e sem direito a frete grátis, já que o erário ainda vai pagar o frete de R$ 2,5 milhões pela doação caridosa aos nossos Hermanos de cuba.

Que sujeito radical, escuto os esquerdistas pensando, ou até mesmo pensando em me atirar uns bagos de feijão por mais essa malcriação em forma de artigo, que dizem eles, “incitam ao ódio, a intolerância”.

Mas aí eu adiciono ao vasto desabafo: O que é um feijão sem um arroz?

Pois bem meu leitor, isso também o governo brasileiro já providenciou, afinal 625 toneladas de feijão pedem um arrozinho nessa “ajuda humanitária”. Por isso A Conab também realizou três leilões de troca de arroz para atendimento à Cuba como se a migração da palestina estivesse rumando para lá e não para Turquia e Grécia.

Vão vendo, vão vendo... Quando o brasileiro se espantar, além da feijoada completa e o arrozinho quentinho, não se exaltem se o cubano não estiver comendo uma bela picanha maturada endossada por Roberto Carlos e Tony Ramos enquanto você aí eleitor de Dilma ainda está roendo os ossos...



sexta-feira, 21 de agosto de 2015

A fantasia que sai da boca do intelectual “social"

Conta Aristóteles que seu mestre Platão ocasionalmente interrompia as aulas que ministrava na Academia para questionar-se, e a seus alunos, se no tema desenvolvido eles estavam partindo dos primeiros princípios ou no caminho que se dirige a eles.

No Brasil são poucos, mesmo nos mais sisudos centros acadêmicos, os que efetivamente se preocupam com essa investigação preliminar de máxima importância em qualquer campo do saber.

Nos debates públicos ventilados na imprensa, então, nem se fala. Nesse universo marcado pelo falatório sofístico não só inexiste preocupação com princípios, como a própria linguagem encontra-se tão corrompida que é impossível sequer saber com um mínimo de clareza e precisão do que se está tratando nas discussões.

E o maior problema é que a adulteração do sentido das palavras é deliberada, envolvendo um projeto de dominação ideológica no sentido marxista do termo, a falsa consciência, o véu de ideias forjadas por um grupo para, ocultando a realidade, explorar os demais com a anuência expressa ou tácita dos próprios explorados.

Esse grupo é a classe letrada, a intelligentsia, obcecada pelo socialismo e imbuída do método gramsciano de reforma do senso comum para implementá-lo, como tem denunciado e fartamente provado o filósofo Olavo de Carvalho. A depravação da linguagem torna impossível identificar, isolar, compreender e enfrentar os problemas postos para a coletividade. Como discutir proveitosamente sobre algo que sequer sabemos o que é?

Mas a difícil tarefa de remover a névoa pegajosa e traiçoeira que recobre certas palavras e expressões vertidas incessantemente na imprensa por intelectuais e políticos de "esquerda" (mas não apenas eles), de modo que os interessados de boa-fé possam ao menos tentar entender com alguma nitidez o que realmente está sendo afirmado e se as propostas de ação política reclamadas são compatíveis ou não com os fins (ocultos ou declarados) almejados.

“Justiça Social” é uma das mais, mais na boca de qualquer populista, mas a ‘justitia’ do latim - que exprime conformidade com o Direito, não necessariamente o Direito Positivo, legislado, que pode ser, e frequentemente é; injusto (exemplo da pensão vitalícia de dez mil reais para ex-governadores), mas os princípios gerais derivados dos valores que formam a Ética de um determinado grupo, que antecedem e informam as leis objetivas e sua interpretação, consubstanciado no mister de dar a cada um aquilo que é seu, como diziam os juristas romanos. E cada indivíduo só é proprietário daquilo que produziu com o seu próprio trabalho ou que adquiriu contratualmente por meio de trocas voluntárias.  

Já o ‘sociale’, relativo à sociedade, ou seja, uma coletividade humana. Ora, se justiça é dar a cada um o que é seu, infere-se necessariamente que a existência de mais de um indivíduo é sua condição sine qua non. Não havia necessidade de justiça para o solitário Crusoe em sua ilha deserta, antes do aparecimento do Man Friday. Tudo lhe pertencia. Assim, toda justiça é por definição social, um imperativo de convívio humano. O adjetivo "social" é, pois, redundante e dispensável.

O mesmo obviamente ocorre com outras expressões, tais como "movimento social", "política social", "investimento social", "questão social", "direitos sociais", "democracia social" e muitas outras, um cúmulo do estelionato semântico demagógico. Até o erudito e em geral lúcido J. G. Merquior embarcou nessa canoa furada com o seu "liberalismo social". O economista e filósofo Friedrich Hayek, em seu clássico Law, Legislation and Liberty, deu-se ao trabalho de enumerar dezenas de termos adjetivados com o infalível "social", que nada acrescentava de racional e esclarecedor aos respectivos substantivos.

Se o "social" nada significa de relevante, porque é tão usado? Porque o sentido oculto dessa palavra é "socialismo", ou seja, a intervenção coletiva, política, estatal, na esfera de autonomia individual, mesmo e sobretudo aquela em que as pessoas não estão tomando dos outros o que não lhes pertence.

Em outras palavras, "social", nesse contexto, consiste em ações coercitivas por meios das quais aqueles que detêm o Poder Político ordenam os comportamentos e dispõem do patrimônio dos indivíduos da forma que bem entendem, dando a cada um o que, segundo critérios inteiramente arbitrários, entendem que cada um merece.

Vê-se que o "social" é mais do que tautológico em relação à justiça. É incompatível com ela. "Justiça social" é pura e simplesmente injustiça. E quem aceita esse conceito distorcido e contraditório como premissa para o debate, mesmo que não seja socialista, já admitiu a viabilidade prática e conferiu validade moral ao socialismo.

Acontece que a incessante ladainha dos intelectuais de "esquerda" é justamente atribuir ainda mais poder e mais dinheiro a essa causa insaciável imarcescível que é essa visão enodoada de uma utopia em causa própria!


sábado, 8 de agosto de 2015

Começou tudo errado

Quem pensa tratar-se da corrupção um problema contemporâneo, um invenção dos tucanos ou petistas ledo engano. A corrupção é um problema crônico no Brasil e, apesar de muitos atribuírem esse problema à falta de caráter daqueles que fazem parte de grupos representativos, como políticos e policiais, não podemos negar que mesmo nesses grupos existem pessoas que não se deixam corromper.

Quando se faz uma comparação entre o passado do Brasil e a situação presente, bastam-se apenas trocar os nomes do passado pelos que rondam os noticiários de escândalos políticos para se ter ideia que o enredo é o mesmo, o que mudou foram os nomes e cargos dos personagens.

Um exemplo não mais que pitoresco da raiz profunda da corrupção plantada desde os tempos de colônia, é de Francisco Targini, o Tesoureiro-mor de D. João VI, que é um caso exemplar de corrupção e impunidade nas altas esferas da administração pública.

Nascido em 1756, em Lisboa, Targini era filho de um italiano e começara a carreira numa casa de comércio como caixeiro, progredindo depois para guarda-livros. Na vida pública, seu primeiro cargo importante foi o de arrecadador de rendas da Província do Ceará.

Nomeado em 1783, lá permaneceu até 1799, malquistando-se com os governadores e ouvidores por seus excessos no combate a práticas administrativas desonestas, bradando honestidade e justiça para o povo.

Targini veio para o Rio com a corte em 1807, ao que parece, sua rápida elevação a homem forte das finanças teve o apoio de um poderoso grupo de negociantes ingleses. Depois de nomeado tesoureiro-mor, ele foi agraciado com o título de barão de São Lourenço, em 1811, e elevado a visconde, em 1819.

Um dos boatos que se contavam dizia respeito à compra de mantas para o Exército que Targini fizera a um fornecedor inglês. O hábil homem público teria mandado dividir cada uma das peça ao meio, revendendo-as depois ao governo pelo dobro do preço original.

Targini também passou à história por ter feito nomear diretor da Academia de Artes, em 1820, após a morte de Lebreton, um medíocre pintor português, Henrique José da Silva, e, como secretário, o padre Luís Rafael Soyé  que, , era um “velho eclesiástico espanhol, de origem francesa, sem honorabilidade nem compostura, poeta de água doce e parasita do ministro Targini, que se oferecera para trabalhar pela metade do preço”.

Homem rico, erário pobre este era o alerta nas cartas ao cunhado e ministro “Del Rey”, o conde de Linhares que apontava Targini como o homem mais corrupto da corte de D. João e recomendava sua demissão.

A ostentação de Targini era tamanha, que mesmo sendo pública a sua condição de ordenado modesto, seus bens contradiziam tamanha máxima que seu salário minguado lhe proviesse tantos mimos que o dinheiro do erário pudesse comprar e torna-lo um homem riquíssimo.

Nas agitações que antecederam a partida do rei, em 1821, Targini chegara a ser preso na Ilha das Cobras. Mas, segundo se disse, isso fora apenas para poupá-lo de agressões, tal era a sua impopularidade. Logo foi solto e embarcou rumo a Lisboa.

Houveram críticas por parte da imprensa pelo fato de o conde dos Arcos, principal ministro do regente, D. Pedro, ter dado por justas e liquidadas as contas do tesoureiro-mor e concedido passaporte para aquele se pôr ao fresco. O inquérito contra Targini, conduzido pelo conde dos Arcos, “estabeleceu a integridade do funcionário, a quem foi concedida uma pensão”.

De fato, Targini, quando chegou a Lisboa, em 1821, foi impedido de desembarcar, retirando-se para Paris. Ali viveu até morrer em 1827, certamente com tempo e dinheiro para gastar em suas obras de erudição.


Targini, que “roubava à grande”, ostentando seus ganhos inspirou a quadrinha popular que terminava dizendo: “Quem mais rouba e não esconde/ passa de barão a visconde”.

terça-feira, 14 de julho de 2015

O argumento mais estúpido que o da revolta da vacina

O início do período republicano da história do Brasil foi marcado por vários conflitos e revoltas populares. O Rio de Janeiro não escapou desta situação. Em 1904, estourou um movimento de caráter popular. O motivo que desencadeou a revolta foi a campanha de vacinação obrigatória, imposta pelo governo federal, contra a varíola.

As manifestações populares e conflitos espalham-se pelas ruas da capital brasileira. Populares destruíram bondes, apedrejaram prédios públicos e espalharam a desordem pela cidade. Em 16 de novembro de 1904, o presidente Rodrigues Alves revogou a lei da vacinação obrigatória, colocando nas ruas o exército, a marinha e a polícia para acabar com os tumultos. Em poucos dias a cidade voltava a calma e a ordem.

Da mesma maneira truculenta, o que era polêmico, hoje é comum, como tomar vacina. Talvez por isso, com esse afã de revolta, um dos principais argumentos usados pelos opositores do casamento gay soa tão estúpido que é difícil de entender por que alguém perderia tempo em debatê-lo. Para os inimigos da causa LGBT, permitir a união civil entre pessoas do mesmo sexo provocaria uma banalização do matrimônio heterossexual e enfraqueceria os laços de famílias nesse padrão. Eu sei, é ridículo, mas a ciência deu um passo atrás e se debruçou sobre o assunto.

Imaginar que um homem e uma mulher deixariam de se casar aqui porque dois homens se casaram acolá é tão delirante que chega a ser penoso pensar em entrar numa discussão com alguém que raciocina assim. Mas no contexto da batalha jurídica da ação coletiva que culminou com liberação do casamento gay nos EUA, seria de grande ajuda provar por A mais B que isso estava errado. Os defensores dessa ideia, afinal, poderiam se esconder atrás da falta de evidências.

Quem teve a paciência de elaborar uma pesquisa para testar o argumento de que a união homossexual afetaria o casamento hétero foram as sanitaristas Alexis Dinno e Chelsea Whitney, da Universidade Estadual de Portland, no Oregon. Taxas de casamentos são um tema comum em estudos de saúde pública porque pessoas casadas são em geral mais saudáveis do que aquelas que vivem sozinhas. O resultado de seu trabalho foi publicado em junho de 2013, exatamente um mês antes de o casal James Obergefell e John Arthur, de Ohio, entrar na justiça com o pedido de reconhecimento de seu casamento, no processo que daria origem à ação coletiva.

Para saber se a realização de casamentos entre pessoas do mesmo sexo realmente provocaria uma redução no número de casamentos heterossexuais ou um aumento no número de divórcios as pesquisadoras foram atrás de registros matrimoniais nos 50 estados americanos e analisaram o que ocorreu durante vinte anos, no período entre 1989 e 2009.

As cientistas se valeram do fato de que alguns estados tinham aprovado leis permitindo o a união homossexual durante esse período. Seria possível, então, não apenas comparar estados pró e contra a causa gay mas também analisar como um mesmo estado reagia a duas legislações diferentes em momentos distintos.

A conta foi difícil de fazer, por requerer uma série de correções estatísticas para compensar lacunas em meio aos dados compilados, mas a conclusão não foi exatamente uma surpresa: assim como a revolta da vacina, as polêmicas criadas pelos “achistas” tendem a cair em função do esclarecimento aos menos esclarecidos quando estudos científicos desmistificam o preconceito e a desinformação.

terça-feira, 16 de junho de 2015

Deuses, astronautas e a miopia telescópica

Nas antigas gerações da história do humana, a ligação entre astronomia e crenças religiosas costumava ser harmoniosa. Constelações com frequência eram apontadas como imagens de figuras míticas desde a Grécia antiga até o Brasil pré-cabralino e histórias como a da Estrela de Belém, que guiou os reis magos ao menino Jesus são comuns em narrativas sagradas. Bastou que surgisse uma ciência dos céus mais ambiciosa, porém, para conflitos virem à tona. Galileu Galilei foi censurado no século 17 por defender que a Terra orbita o Sol, e só em 1992 o Vaticano o perdoou oficialmente, sou católico, mas também sou cientista solidário a Galileu. Atualmente, cristãos convivem em harmonia com os astrônomos, mas isso não impede que outras religiões venham a se sentir desrespeitadas pelos estudiosos do Universo.

Quem está enfrentando os astrônomos agora, porém, não é a Igreja Católica, e sim praticantes de uma religião minoritária num arquipélago remoto do Pacífico. Durante quatro décadas, cientistas usaram Mauna Kea, uma montanha na Ilha Grande do Havaí considerada sagrada, para construir telescópios, indo contra pedidos de líderes espirituais. Hoje já existem 12 observatórios no local, mas um projeto que ganhou aval agora o gigante TMT (Telescópio de Trinta Metros), talvez seja o último a se instalar ali. Após protestos com nativos fechando estradas em Mauna Kea e em Hononulu, capital estadual, o governo determinou que é hora de começar a desativar alguns equipamentos.

Mauna Kea, um vulcão extinto que forma um pico de 4.200 metros de altitude, é considerado pela tradição havaiana uma figura mítica em si. É ele o primeiro dos filhos de Wakea (o pai Sol) com Papa (a mãe-Terra): é onde o arquipélago do Havaí começou a nascer. O local é também considerado o lar de Poliahu, deusa da neve, e abriga em sua encosta o pequeno lago Waiau, um centro de batismo onde são depositados cordões umbilicais. Por seu caráter sagrado, a montanha teve vias de acesso controladas ao longo dos séculos, e apenas líderes tribais de alto escalão podiam visitar o pico.

Foi assim até 1960, quando o astrônomo Gerard Kuiper chegou perto do pico e constatou seu potencial para observação do céu. Algumas cidades da ilha tinham acabado de ser devastadas por um tsunami, e os comerciantes locais acharam que seria uma boa ideia atrair grandes projetos de astronomia para o arquipélago como forma de ajudar a reavivar a economia local. Construiu-se uma estrada de acesso à montanha e, em 1968, o terreno estadual que abriga o pico de Mauna Kea foi arrendado para a Universidade do Havaí num contrato de 65 anos. Em 1970, implantou-se o primeiro observatório lá, operando um telescópio de 2,2 metros de diâmetro. E desde então o lugar virou uma Meca da astronomia, com a universidade sendo procurada pelos projetos mais ambiciosos do campo.

Quem sobe em Mauna Kea para assistir a um pôr do Sol logo percebe por que o local é tão especial tanto para a religião quanto para a ciência. O pico, que fica quase permanentemente acima das nuvens, oferece uma visão espetacular da ilha e de seus outros vulcões. É o tipo de paisagem que inspira sentimento de transcendência e respeito pela natureza. E quando se olha para cima, o céu que fica totalmente limpo em 325 noites por ano é considerado por astrônomos um presente dos deuses.

Durante 20 anos de funcionamento, o Observatório Keck, o maior de Mauna Kea, tem tido um papel importante em temas de ponta da astronomia, particularmente no estudo de planetas fora do Sistema Solar. O TMT terá uma escala a ponto de ajudar a analisar a composição atmosférica desses planetas, e promete ser uma ferramenta útil no estudo da misteriosa matéria escura, que compõe 85% da massa do Universo. Mas mesmo os outros observatórios da montanha têm produzido observações importantes, e será difícil convencer astrônomos a abrir mão de continuar observando os céus a partir de lá. Só que alguém vai ter de sair.

Para encerrar os protestos contra os telescópios, o governador do Havaí, David Ige, ajudou a articular um acordo de paz entre astrônomos e líderes espirituais. Segundo os termos anunciados na semana passada, a instalação do TMT fica garantida, mas pelo menos quatro telescópios de Mauna Kea deverão ser desativados até a inauguração do novo projeto, estimada para 2022. Com exceção do CSO (Caltech Submillimeter Observatory), que já tinha saída programada para 2016, ninguém se voluntariou. A negociação sobre quem vai para o sacrifício, pelo visto, não será fácil.

Entre outros projetos que estão lá se destacam o gigante Subaru, do Japão, o Gemini Norte, consórcio que tem participação do Brasil, e o CFHT, do Canadá e da França. É provável que os expulsos sejam os menores, como o telescópio de 2,2 da Universidade do Havaí, mas não está claro o que deverá acontecer depois. Além disso, nenhuma nova área de construção será concedida no local, o que torna o deserto do Atacama, no Chile, o único ponto do planeta com qualidade equiparável para instalar novos telescópios do porte do TMT.

Alguns astrônomos ficaram frustrados com a decisão sobre Mauna Kea, mas é difícil qualificar a demanda dos grupos religiosos havaianos como uma perseguição inquisitória à ciência. Ninguém ali está tentando impor uma crença obrigatória nem ameaçando mandar para a fogueira os que não professam a mitologia havaiana. Trata-se da reivindicação de um território que pertencia a povos tradicionais. O caráter espiritual de Mauna Kea sobreviveu às invasões francesa e inglesa no século 19, e é irônico que justamente agora, como unidade de conservação estadual, a montanha esteja cheia de gente.


O acordo anunciado pelo governo, além de estabelecer um calendário para a desativação de telescópios, exige que os visitantes da montanha, cientistas ou turistas, passem por treinamento cultural. Além de fazer um minicurso para aprender como lidar com o ar rarefeito e a radiação ultravioleta do local, quem quiser subir a montanha terá de aprender agora a se comportar com o devido respeito a Wakea, Poliahu e outras divindades locais. 

sexta-feira, 5 de junho de 2015

Não existe almoço grátis

Imagine a seguinte cena: na hora do almoço, você passa na frente de um grande centro comercial, cheio de restaurantes. Ao lado deles, você vê de relance um estande com uma grande placa que diz "Dinheiro de graça".
Você passa mais perto para ver do que se trata e na frente do estande, vê uma placa menor com a indicação do valor disponível. Estudantes estão dentro do estande e no balcão está uma pilha de notas de dinheiro no valor estabelecido.
Se a expressão "de graça, até injeção na testa" fosse verdadeira em todos os momentos, as notas de dinheiro se acabariam logo. O processo seria todo tão rápido que as suas chances de chegar a tempo no estande seriam ínfimas. Provavelmente, você nem teria ficado sabendo que havia uma distribuição de notas de dinheiro de graça no seu percurso do almoço.
No entanto, algo não parece certo. Aqui parece reinar uma outra expressão, preferida por economistas, de que "não existe almoço grátis" (por sinal, apropriada para a ocasião). Estamos sempre certos de que existe alguma intenção escondida ou uma pegadinha pronta. Afinal, por que alguém distribuiria dinheiro de graça, sem ter nada em troca?
Neste caso, o motivo é simples: para estudar o nosso nível de desconfiança. Se você foi um dos que passou pelo estande que Dan Ariely, autor de "Previsivelmente Irracional" montou em uma manhã em um centro comercial em Cambridge, no Massachusetts, as chances de que você parou para pegar a sua nota de dinheiro gratuita são baixas.
Quando a placa dizia que você podia pegar uma nota de US$ 1, apenas 1% dos passantes foram buscar a sua. Conforme a oferta subia (para US$ 5, US$ 10, US$ 20), o número de pessoas que pegava uma aumentava, mas ainda assim, muito pouco. Mesmo quando ofereceram US$ 50, apenas 19% dos passantes parou para pegar uma nota.
"Claramente, a grande maioria acreditou que era algum tipo de truque de tal forma que não valia a pena nem perguntar", relata Ariely. Afinal, vemos tantos esquemas dúbios, empresas corruptas, ofertas enganosas e propagandas exageradas que somos todos muito desconfiados, até de quem não precisa.
O alto nível de desconfiança generalizada encontrado com este estudo revela um cenário grave, pois a confiança funciona como um "lubrificante" da economia, segundo Ariely: "quando as pessoas confiam umas nas outras, elas tendem mais a comprar, emprestar e conceder crédito". Sem confiança, temos mais dificuldade de acreditar em quem merece e até de se manter correto, em um mundo onde todos tentam tirar vantagem dos outros.


sábado, 16 de maio de 2015

Pedro, o lobo e as eternas reuniões

Quando me pedem uma análise rápida sobre cenário tucuju atual, as pessoas se assustam quando começo com a velha cantilena do Pedro e o lobo, para quem não conhece a historieta infantil de Sergei Prokofiev é muito simples explicar, já que Pedro sempre gritava a vinda de um suposto lobo que assustava todos ao seu redor e cada um corria para se abrigar do lobo feroz que no fim das quantas nunca aparecia. Talvez por tantos alarmes falsos Pedro tenha perdido a credibilidade perante os seus, e quando finalmente o lobo resolveu atacar e Pedro gritou sua vinda, ninguém mais acreditou e o resultado é que todo mundo foi parar na barriga do lobo.
Basicamente é assim o cenário atual, afinal todo mundo está sempre muito ocupado resolvendo coisas indizíveis naquelas eternas reuniões dos funcionários públicos em que sempre Pedro está gritando a vinda do lobo e sempre se orquestra uma reunião para falar de Deus ao diabo.
Ora bolas, reuniões devem ser esporádicas, emergenciais e/ou balancetes anuais. Há que se trabalhar. Para o povo. Murais, folhetos, folhetins, avisos, papéis – dezenas de milhares de reais gastos – internamente. Para que? Para um ficar sabendo da vida do outro colega? Reparem nisso. Em toda repartição pública você nota dezenas de murais, avisos, ordens, até compra e venda de imóveis. Tudo interno. Aniversário, casamentos, noivados, batizados...
Porém, o pior problema são os funcionários públicos de algumas repartições que, por ser palavra antiga, muito usada no filme “Carnaval na Atlântida”, com Oscarito e Grande Otelo, prefiro registrar, instituições públicas.
Dia inteiro em reuniões, cursos, debates internos, encontros, festividades internas... Tudo em nome da luta contra o câncer da mama, fuga de stress, integração emocional, luta contra a pressão arterial, contra o fumo, contra a depressão, cursos de informática, de liderança de grupo, de racionalização dos serviços e, pasmem, entre tantos outros milhares de encontros internos, a eficiência em atender ao cliente, ao público que paga de seu próprio bolso tudo isso!
E, justamente esse público é que fica sem atendimento. Valorizam o funcionário e se “esquecem” do público, a razão maior de tudo e que até, certa vez, o governo brasileiro criou um tal de “ministério da desburocratização” que foi um verdadeiro mistério...
Mudou tudo. Antigamente (adoro essa palavra) o cliente, o público era o alvo principal das instituições públicas. Hoje é o funcionário!
Você entra num banco. Cadê o gerente? Está em reunião sobre como atender bem o público! Portanto, o público fica mesmo sem atendimento!
Numa secretaria de Estado, cadê o secretário? Está em reunião. Nunca, em toda a minha vida, encontrei um secretário de Estado que não estivesse em reunião.
Só as telefonistas é que nunca estão reunidas. Antes de serem contratadas, recebem a ordem, por escrito, de falarem, primeiro, que o patrão não está. Depois de identificado, pede o seu telefone para retornar a ligação, e esta nunca retorna.
Até certo ponto acho correta esta última atitude pois é lamentável/paradoxal você se dirigir a algum órgão público e ficar horas a fio olhando a cara do funcionário com quem deseja orientar-se – às vezes apenas para saber onde fica determinada sessão – falando e atendendo as pessoas que ficam telefonando para ele. Até você se cansar, perder um tempão e ir para casa telefonar para ele, na certeza absoluta de que, pelo telefone será atendido!
Ou como faço e passo a ensinar meu público leitor. Sentado à frente do gerente que não para de atender ao telefone, ligo de meu celular para o telefone dele e faço a mais absoluta questão de, cara a cara, falar com ele pelo celular.
Mas talvez o mal maior destas intermináveis reuniões seja o fato de que quando o chefe maior pergunta como está sendo resolvida determinada situação, o “povo da reunião” sempre responda:  Está tudo a mil maravilhas!”.

Se você gestor ouvir isso de sua equipe, pode ter certeza de uma coisa: Pedro está gritando que o lobo vem e desta vez ele vem mesmo!

segunda-feira, 4 de maio de 2015

Dolly, a precursora das ovelhas monocromáticas

Stálin era um visionário: na sua paranoia criminosa, ele conseguiu apagar de fotos "oficiais" os inimigos reais (ou imaginários) da sua estimável ditadura muitos anos antes do Photoshop ser inventado.

Mas não só: com igual engenho, ele próprio aparecia em fotos decisivas, sobretudo na companhia de Lênin, como forma de mostrar ao povo soviético quem era o verdadeiro herdeiro bolchevique (tradução: era ele, e não Trótski).

Passou quase um século. Mas a tentação de "apagar" o passado não larga certas cabeças com deficit de liberdade.

Um caso aparentemente menor mostra como: leio na virtualíssima "Slate" que Ben Affleck, um conhecido ator e "liberal" americano ("liberal" no sentido esquerdista do termo), pediu à PBS (televisão pública norte-americana) que um fato da sua família não fosse incluído no documentário "Finding Your Roots" ("encontrando suas raízes").

O referido documentário, da autoria de Henry Louis Gates Jr., procura revelar ao mundo quem eram os antepassados de várias figuras públicas. E um dos antepassados de Ben Affleck era ó miséria das misérias! Um proprietário de escravos.

Affleck, depois de um presumível achaque nervoso, pediu à PBS para apagar essa nódoa. A PBS, em grande gesto deontológico que só honra o jornalismo, concordou. Primeiro, porque o antepassado escravocrata de Affleck "não era má pessoa", disse o autor do programa (sem rir).

E, depois, porque Affleck tinha nomes mais interessantes no cardápio: generais, ativistas dos direitos humanos etc. que não comprometiam a canonização do ator. Para que sujar essa canonização com a ovelha negra, ou branca, da família?

O caso é primoroso porque mostra duas coisas sobre a cabeça de um ator que gosta de debitar grandes lições de moralidade sobre os outros mas que abomina os espelhos que tem em casa.

A primeira lição é a incorrigível ignorância que existe nessa cabeça: qualquer cidadão de um país com passado escravocrata pode ter antepassados pouco recomendáveis. Os Estados Unidos são um caso.

Portugal seria outro: nunca fiz uma história genealógica da família. Falta de interesse, de tempo, ou ambos. Mas não me espantaria que, nos séculos 16 ou 17, houvesse por lá um Borges qualquer que, depois de comprar escravos na África (normalmente de um vendedor negro, que os capturava nas profundezas da selva para os vender na costa), os transportasse depois para as plantações do Novo Mundo.

A ideia de que eu, nascido em 1970, sou responsável por eventuais crimes cometidos por antepassados 300 ou 400 anos atrás só faz sentido na cabeça analfabeta de Ben Affleck.

Confrontado com um antepassado escravocrata, bastava que Affleck usasse algum humor ("felizmente, não o conheci") para que o assunto ficasse encerrado.

Só que "humor" é palavra interdita para um moralista. E esta é a segunda lição: se o caso não servisse para fazer piada, Affleck poderia sempre pedir "perdão" pelos crimes alheios, mantendo o seu halo de santidade.

Essa atitude, aliás, tem sido moda no Ocidente desde que Bill Clinton pediu desculpa pela escravatura; Tony Blair pelas fomes da Irlanda no século 19; ou até João Paulo 2º pelas Cruzadas.

As consciências progressistas sempre aplaudiram essas expiações anacrônicas, talvez por imaginarem que, hoje, ano da graça de 2015, a nossa imaculada conduta jamais será reprovada por quem viver em 2215.

O problema é que, nos Estados Unidos, pedir desculpas não chega. E o milionário Ben Affleck poderia ser confrontado com a indústria das reparações, que nos últimos anos tem exigido quantias exorbitantes à República americana pelos crimes da escravatura.

Perante todos esses dilemas, o que fez Affleck? Simples: para proteger a hipocrisia da imagem (e o recheio da carteira), pediu o exato tipo de censura que ele é sempre o primeiro a condenar. E como sabemos disso?

Ironia final: porque o pedido de censura de Affleck foi revelado pelo WikiLeaks, essa nobre instituição que é o sonho úmido de qualquer "liberal" que se preze.

Não há maior escravidão que esta: sermos vítimas da nossa própria vaidade e estupidez.
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