terça-feira, 19 de março de 2013

O anacronismo do escândalo


Ao ler as noticias do dia não pude deixar de lembrar-me de um episódio da velha República protagonizado por Nair de Teffé, a época primeira dama na companhia do Marechal Hermes, então presidente do Brasil.

Em uma festa de despedida do Marechal, Nair resolveu fechar com chave de ouro sua passagem pelo Catete, tentando dar um clima leve ao período tenso que antecedia as eleições. Vanguardista por natureza, Nair de Teffé não quis fazer mais uma daquelas festas que lembravam o ultimo baile do império lá na ilha Fiscal.

E por isso resolveu levar o compositor Catulo da Paixão Cearense com violão a mão a acompanha-la na musica que ela considerava a “mais brasileira” o maxixe “Corta–jaca” de Chiquinha Gonzaga.

Juntavam-se então, duas coisas explosivas para uma recepção diplomática da época: o violão, instrumento da malandragem e dos morros; e o maxixe, ritmo popular e considerado extremamente sensual.

A repercussão não poderia ser mais terrível. Pois fez com que Rui Barbosa em pessoa descesse do cume da águia e registrasse no diário do Congresso Nacional um violento pronunciamento: “Que diante de uma das folhas em que estampada estava a programação da recepção presidencial em que diante do corpo diplomático, da mais fina sociedade do Rio de Janeiro, aqueles que deviam dar exemplo das maneiras mais distintas e dos costumes mais reservados elevaram o Corta-jaca à altura de uma instituição social.

Mas o que vem ser este Corta-jaca de quem tenho ouvido falar a tanto tempo Senhor Presidente? Senão a mais baixa, a mais chula, a mais grosseira de todas as danças selvagens, a irmã gêmea do batuque, do cateretê e do samba.

Mas nas recepções presidenciais o Corta-jaca é executado com todas as honras da música de Wagner. E a não ser que a consciência do país se revolte e que nossas faces se enrubesçam. “Seguiremos rumo a um ponto onde tudo é tolerável e o mais baixo criminoso travestira-se de santo”.

Talvez a indignação da velha águia de Haia tenha sido exagerada até mesmo para a época. Mas o que então diria Rui Barbosa ao ver José Genoíno, condenado pela suprema corte, assentando-se na Câmara Federal. Ou João Alberto Capiberibe com arroubos de moralidade dentro da mesma casa de veludo azul que um dia deu-lhe o passe de saída por crime eleitoral comprovado a tolher-lhe do manto de santidade.

Seriam muitas jacas para cortar! Diria Rui Barbosa enrubescido de vergonha. 
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