Ao ler as noticias do dia
não pude deixar de lembrar-me de um episódio da velha República protagonizado
por Nair de Teffé, a época primeira dama na companhia do Marechal Hermes, então
presidente do Brasil.
Em uma festa de despedida do
Marechal, Nair resolveu fechar com chave de ouro sua passagem pelo Catete, tentando
dar um clima leve ao período tenso que antecedia as eleições. Vanguardista por
natureza, Nair de Teffé não quis fazer mais uma daquelas festas que lembravam o
ultimo baile do império lá na ilha Fiscal.
E por isso resolveu levar o
compositor Catulo da Paixão Cearense com violão a mão a acompanha-la na musica
que ela considerava a “mais brasileira” o maxixe “Corta–jaca” de Chiquinha
Gonzaga.
Juntavam-se então, duas
coisas explosivas para uma recepção diplomática da época: o violão, instrumento
da malandragem e dos morros; e o maxixe, ritmo popular e considerado
extremamente sensual.
A repercussão não poderia
ser mais terrível. Pois fez com que Rui Barbosa em pessoa descesse do cume da
águia e registrasse no diário do Congresso Nacional um violento pronunciamento:
“Que diante de uma das folhas em que estampada estava a programação da recepção
presidencial em que diante do corpo diplomático, da mais fina sociedade do Rio
de Janeiro, aqueles que deviam dar exemplo das maneiras mais distintas e dos
costumes mais reservados elevaram o Corta-jaca à altura de uma instituição
social.
Mas o que vem ser este
Corta-jaca de quem tenho ouvido falar a tanto tempo Senhor Presidente? Senão a
mais baixa, a mais chula, a mais grosseira de todas as danças selvagens, a irmã
gêmea do batuque, do cateretê e do samba.
Mas nas recepções
presidenciais o Corta-jaca é executado com todas as honras da música de Wagner.
E a não ser que a consciência do país se revolte e que nossas faces se
enrubesçam. “Seguiremos rumo a um ponto onde tudo é tolerável e o mais baixo
criminoso travestira-se de santo”.
Talvez a indignação da velha
águia de Haia tenha sido exagerada até mesmo para a época. Mas o que então diria
Rui Barbosa ao ver José Genoíno, condenado pela suprema corte, assentando-se na
Câmara Federal. Ou João Alberto Capiberibe com arroubos de moralidade dentro da
mesma casa de veludo azul que um dia deu-lhe o passe de saída por crime
eleitoral comprovado a tolher-lhe do manto de santidade.
Seriam muitas jacas para
cortar! Diria Rui Barbosa enrubescido de vergonha.