sexta-feira, 15 de abril de 2016

Síndrome de Regina Duarte


Em minha juventude encontrei o País em distensão. Na aurora dos contagiantes anos oitenta, testemunhei as grandes manifestações pela redemocratização. A lembrança das “Diretas Já” me soa triste: na noite da derrota da emenda Dante de Oliveira, cheguei em casa e vi minha família apreensiva sem ainda conseguir perceber o curso poderoso das coisas para além de nossas vontades, aquilo que se costuma chamar o espírito do tempo. Eram tempos de abertura. Que tempos são os nossos, afinal?
Embora a Lei de Anistia resista e os agentes oficiais da repressão continuem impunes, a Comissão Nacional de Anistia, bem como as estaduais, tem feito nos últimos anos um trabalho incansável quanto ao resgate da significação do Estado de Exceção por meio das indenizações laborais e pedidos de perdão às vítimas. Entre 2012 e 2014, a Comissão Nacional da Verdade vasculhou os escombros da nação e trouxe à tona um extenso relatório com recomendações, sem a participação dos arquivos militares, que se recusaram a colaborar.  
Houve já quem dissesse que fazemos a história, sim, mas não do modo que queremos. Bingo. A passagem dos 50 anos da quartelada nem de longe significou uma apropriação simbólico-narrativa do País a respeito da recente violência de Estado. Bem ao contrário, poucos meses depois de apresentado o relatório final da referida comissão, vimos estupefatos pelas ruas pedidos de intervenção militar e o que antes era um envergonhado silêncio tornou-se um agressivo discurso que retoma a narrativa da “gloriosa” que livrou o País dos “comunistas”. E, pasmem, o governo é comunista e deu no que está dando!
Então, como um grito preso na garganta ecoa o reprimido brado retumbante, a par de todo o assombroso roteiro de deposição do governo legitimamente eleito, que vai do impeachment que também é um instrumento legal e constitucional, pode passar pela renúncia de Dilma e quiçá chegar à convocação de novas eleições.
O #NãoVaiTerGolpe avança finalmente como a dessublimação do “não houve golpe”, “não foi golpe, foi revolução” e congêneres. Nunca antes na história deste País, nem nos 50 anos de 64, o País assumiu tão desabridamente seu passado de golpe e ditadura.
A população, assim como a minha família na década de 80 às portas da redemocratização, acompanha incólume o desfecho do verdadeiro circo cujas lonas se levantam em pleno eixo monumental aguardando os circenses adentrarem ao picadeiro.

Resta saber quais serão as consequências disso tudo, afinal nos tempos de Collor, o povo ainda estava no ritmo pós ditadura e não sabia brigar. Lamentavelmente recordando os protestos recentes e a violência  aplicada neles dos dois lados contrários, realmente posso recordar Regina Duarte durante a campanha eleitoral de 1990: Tenho medo de Lula, tenho medo do PT e da capacidade de mobilizar o caos, quer esteja no poder ou brigando por ele!
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