Quem
pensa tratar-se da corrupção um problema contemporâneo, um invenção dos tucanos
ou petistas ledo engano. A corrupção é um problema crônico no Brasil e, apesar
de muitos atribuírem esse problema à falta de caráter daqueles que fazem parte
de grupos representativos, como políticos e policiais, não podemos negar que
mesmo nesses grupos existem pessoas que não se deixam corromper.
Quando
se faz uma comparação entre o passado do Brasil e a situação presente, bastam-se
apenas trocar os nomes do passado pelos que rondam os noticiários de escândalos
políticos para se ter ideia que o enredo é o mesmo, o que mudou foram os nomes
e cargos dos personagens.
Um
exemplo não mais que pitoresco da raiz profunda da corrupção plantada desde os
tempos de colônia, é de Francisco Targini, o Tesoureiro-mor de D. João VI, que é
um caso exemplar de corrupção e impunidade nas altas esferas da administração
pública.
Nascido
em 1756, em Lisboa, Targini era filho de um italiano e começara a carreira numa
casa de comércio como caixeiro, progredindo depois para guarda-livros. Na vida
pública, seu primeiro cargo importante foi o de arrecadador de rendas da
Província do Ceará.
Nomeado
em 1783, lá permaneceu até 1799, malquistando-se com os governadores e
ouvidores por seus excessos no combate a práticas administrativas desonestas,
bradando honestidade e justiça para o povo.
Targini
veio para o Rio com a corte em 1807, ao que parece, sua rápida elevação a homem
forte das finanças teve o apoio de um poderoso grupo de negociantes ingleses.
Depois de nomeado tesoureiro-mor, ele foi agraciado com o título de barão de
São Lourenço, em 1811, e elevado a visconde, em 1819.
Um
dos boatos que se contavam dizia respeito à compra de mantas para o Exército
que Targini fizera a um fornecedor inglês. O hábil homem público teria mandado
dividir cada uma das peça ao meio, revendendo-as depois ao governo pelo dobro
do preço original.
Targini
também passou à história por ter feito nomear diretor da Academia de Artes, em
1820, após a morte de Lebreton, um medíocre pintor português, Henrique José da
Silva, e, como secretário, o padre Luís Rafael Soyé que, , era um “velho eclesiástico espanhol, de
origem francesa, sem honorabilidade nem compostura, poeta de água doce e
parasita do ministro Targini, que se oferecera para trabalhar pela metade do
preço”.
Homem
rico, erário pobre este era o alerta nas cartas ao cunhado e ministro “Del Rey”,
o conde de Linhares que apontava Targini como o homem mais corrupto da corte de
D. João e recomendava sua demissão.
A
ostentação de Targini era tamanha, que mesmo sendo pública a sua condição de
ordenado modesto, seus bens contradiziam tamanha máxima que seu salário
minguado lhe proviesse tantos mimos que o dinheiro do erário pudesse comprar e
torna-lo um homem riquíssimo.
Nas
agitações que antecederam a partida do rei, em 1821, Targini chegara a ser
preso na Ilha das Cobras. Mas, segundo se disse, isso fora apenas para poupá-lo
de agressões, tal era a sua impopularidade. Logo foi solto e embarcou rumo a
Lisboa.
Houveram
críticas por parte da imprensa pelo fato de o conde dos Arcos, principal
ministro do regente, D. Pedro, ter dado por justas e liquidadas as contas do
tesoureiro-mor e concedido passaporte para aquele se pôr ao fresco. O inquérito
contra Targini, conduzido pelo conde dos Arcos, “estabeleceu a integridade do
funcionário, a quem foi concedida uma pensão”.
De
fato, Targini, quando chegou a Lisboa, em 1821, foi impedido de desembarcar,
retirando-se para Paris. Ali viveu até morrer em 1827, certamente com tempo e
dinheiro para gastar em suas obras de erudição.
Targini,
que “roubava à grande”, ostentando seus ganhos inspirou a quadrinha popular que
terminava dizendo: “Quem mais rouba e não esconde/ passa de barão a visconde”.