sexta-feira, 28 de setembro de 2012

Por favor, devolvam as prostitutas!


A primeira viagem internacional que fiz tinha uma escala em Madri. Lembro-me desta viagem bem mais do que das outras, não só por ser a primeira viagem para fora das fronteiras de nossa ensolarada América, mas também por ter tido o constrangimento alheio ao ver como uma brasileira foi tratada no setor de imigração espanhol.

Só não a chamaram claramente de prostituta, mas faltou pouco, muito pouco, até que teve ser passaporte carimbado e foi devolvida para seu país de origem.  Isso tudo aconteceu no espaço de meia hora entre o desembarcar e o retornar à contenção para aguardar um voo de retorno.

Este não foi o único fato acontecido por lá, na verdade devem ter ocorrido centenas ou quem sabe milhares de casos como este.  Quando um brasileiro ou brasileira tentava descer em solo espanhol e ser taxado de "imigrante morto de fome" ou de "prostituta", ficava a escolha do oficial da imigração supor sobre nós.

O Brasil era sempre visto com desconfiança, afinal pertencíamos ao terceiro mundo (era assim que se referiam a nossa economia nos anos 80), como se o brasileiro viesse de alguma galáxia extremamente primitiva para ser tão bem vindo à Europa como pernil na sinagoga.

Esta politica xenófoba não era exclusividade do velho mundo, recordo da citação de J. Edgar Hoover quando comandava o FBI nos anos 30 e alardeava aos quatro ventos que a maior baboseira que os EUA podiam ter feito foi inscrever no pedestal da estátua da liberdade: “Venham a mim as massas exaustas, pobres e confusas ansiando por respirar liberdade. Venham a mim os desabrigados, os que estão sob a tempestade. Eu os guio com minha tocha."

Segundo ele, era um convite a toda escória do mundo para ir viver à custa do Tio Sam.

Mas o mundo dá muitas voltas e atualmente o colapso das grandes economias mundiais tem cada vez mais levado a um processo de imigração às avessas, de onde partem hoje americanos e espanhóis rumo à república das bananas do terceiro mundo.

Ávidos pela receptividade brasileira vêm em busca de empregos e condições de vida melhores  e são recebidos com sorrisos e o calor que só em terras brasilianas sabemos gerar. Bem diferente da receptividade humilhante a qual os brasileiros eram sempre submetidos, alijados a cantos e filas das salas de imigração, a lidar com as carrancas dos oficiais de imigração.

Os antes persona non grata made in Brazil assim como os chineses, que fartamente descobriram o calor do capitalismo, passaram a ser tão bem vindos quanto se fossem membros seculares da família Rockfeller ou Rothschild.

Novos tempos, novas visões e diretrizes se adaptando para as realidades do século XXI. Nunca em minha vida achei que iria ver uma massa de norte americanos clamando emprego fora de Neverland ou que veria os tão empertigados espanhóis tendo que colocar cadeados nas latas de lixo para que o próprio povo espanhol não coma os restos dos poucos que ainda tem com o que se sustentar...

Eis que ainda deve chegar o tempo em que o fomento externo se estagne de tal maneira que lamentavelmente, mas sem perder a empáfia  veremos os mesmos algozes que humilharam tantos cidadãos brasileiros, irem para as campanhas de turismo receptivo implorar pela volta das “prostitutas”.

segunda-feira, 24 de setembro de 2012

Desânimus ao narrar


O intento de contar algo que testemunhou ou ouviu sobre alguém pode ter várias conotações dependendo da maneira com que se interpreta a finalidade do contar sobre o ocorrido, mesmo que seja com animo praesenti ou ex animo.
Tenho acompanhado o carismático radialista GB, que antes fazia suas colocações e conjunturas com a liberdade que a imprensa bem lhe dispunha ao direito de narrar um fato, em que a fonte conhecida é sempre revelada, entrar em um ocaso que eclipsou suas palavras sob o mantra da justiça que lhe cerceou não só do direito de narrar, mas também o privou da isonomia constitucional, já que pelo jeito “Chico”’ e “Francisco” não compartilham do mesmo pau na surra.
Há algumas semanas o jornalista leu em seu programa matinal um artigo de um dentre os muitos jornais locais que narrava um idílio fartamente de conhecimento público entre um candidato e sua ex-cônjuge sobre a intimidade das batalhas conjugais. Como penalidade, foi multado pela justiça e sentenciado a ficar fora do ar, assim como a emissora em que o programa é veiculado.
Não obstante a isso, o jornalista novamente lê em seu programa que um candidato tem uma parceria com outro candidato visando o segundo turno das eleições, dando novamente o credito à fonte de tema fartamente conhecido pelo público. E novamente a sentença: mais uma vez fora do ar, tanto o jornalista quanto a emissora.
Segundo a alegação dos impetrantes, em ambos os casos não há veracidade no que foi narrado, mas dá-se o crédito que o que foi dito é de domínio público, já que os dois fatos narrados, até “Matilde” conhece em sua afamada boca.
Vamos convir que a afirmação genérica de um fato não descreve seu acontecimento concreto pode ser caluniosa e ainda mais quando se atribui um fato determinado que fugisse da alçada das línguas injuriosas, talvez até caindo no universo dos acontecimentos difamadores. Mas e quando houve a retransmissão de um meio de massa para outro meio de massa? Onde reside a culpabilidade?
A prerrogativa da lei diz que deve haver falsidade no fato e que o agente deve ter consciência disso para que ele entre no véu das penalidades. Mas quando o agente crê naquela informação que lhe foi dada por outro meio de comunicação de massa tão crível quanto seu? Então em quem crer senão na comunicação de massa? Conclui-se então que não há enquadramento em ato calunioso e, por conseguinte não há dolo.
A falsidade pode ser quanto à existência do fato, onde o agente narra o fato sabendo que não ocorreu e, quanto à autoria, visto que o fato realmente existiu.  Da mesma maneira vimos um caso semelhante onde uma página digital foi tirada do ar por uma publicação desprovida de sentido, senão o de servir de lenha para um já conturbado processo eleitoral macapaense.
Então me pergunto: se a autora vai a público e afirma um fato e alguém decorrente do saber do fato o retransmite, há de se imaginar, será o agente autor da fraude ou dolo? Ou quem a gerou é por si o injuriado do fato ou o que o divulgou para reafirmação do que um universo maior já tinha conhecimento do fato narrado por outros meios será o único agente do dolo?
Diz a lei que a imputação da prática de um fato determinado, ou seja, concreto, específico. Faz-se indispensável que o agente, de modo expresso, precise o fato e em que circunstâncias o mesmo se deu, mas não se exige que se faça necessária uma descrição pormenorizada; sendo suficiente uma síntese lógica, inteligível ou compreensível por todos.
A atribuição de generalidades ou circunstâncias de fato suscetíveis de interpretação díspares não configura um delito de calúnia, pelo que sequer pode compor e justificar uma queixa-crime. Não basta apenas a afirmação genérica, sendo necessária a imputação de fato que o constitua crime com todas as circunstâncias da infração.
E o que pode ser pior se em um futuro não tão distante o fato for consubstancialmente verdadeiro? Há crime? E se não houver crime? O que fazer com a pena imputada, não me refiro a multa; afinal, multas podem ser sustadas ou restituídas caso já se a tenha quitado. Mas e o dolo moral por ser penalizado por divulgar um fato real tido equivocadamente como inverídico?
Em suma, o direito de divulgar um fato ainda é livre à imprensa e se este sim, julgado e não pré-julgado de culpa, deve ter sustação de sua veiculação por inverdades que porventura possam levar o ouvinte, leitor ou telespectador á indução ao erro em suas ações e julgamentos baseados em inferências à margem da realidade dos fatos.
Vou ser condescendente com o nobre radialista GB e lhe transmitir um procaz animus consulendi diante dos fatos que lhe cercearam a língua da liberdade de informação. Que mesmo com o regime bolchevista que se instala alardeando o animus calumniandi a qualquer fato divulgado pela comunicação de massa, vamos ainda como nosso animus defendendi a proteger o sagrado instituto do animus narrandi.
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