Em
uma visita ao senado, que mesmo sem os senadores presentes por causa do recesso
branco, funciona normalmente. A gente acaba encontrando alguns itens pitorescos
que incitam a mente a questionar o porquê de certas excrescências no âmbito do
poder.
Uma
delas foi um alfarrábio que me enfiaram goela abaixo, impresso em papel “pólen
bold” de excelente qualidade (o papel, é claro), que discorria sobre a atuação
incessante de um senador amapaense, seus feitos grandiosos, suas façanhas internacionais
e sua luta pela democracia!
Fico
imaginando na riqueza do impresso, nas laudas e laudas de linguiças enchidas
com loas e loas e loas a este épico herói amapaense. Não sei de onde sai tanta
inspiração para uma composição quase camoniana. Mas sabemos sim de onde sai o
recurso para fazer as rotativas da gráfica do senado prensar tal marmota.
A
resposta vem de uma reflexão de quanto tempo gastamos uma vez por ano diante de
uma tela de computador, suando para decifrar os comandos de um idioma
estranhíssimo, cujo vocabulário inclui “declaração de ajuste”, “tributação
suspensa” ou “extrato Dirpf” em nossas declarações de imposto de renda.
Dos
temores quase bíblicos que temos da malha fina; uma entidade mais aterradora
que o próprio diabo. Produtos da nossa Receita Federal que tudo sabe sobre os
caraminguás de cada um de nós, que enfia as mãos no nosso bolso, vasculha
nossas contas bancárias, pergunta detalhes da nossa condição conjugal, separa
nossos centavos de um lado para outro e, depois, pega a bolada que bem entende.
Pelas
bandas de “acá” nós sabemos quanto custou ganhar os reais que vão embora para
Brasília na velocidade da luz. E em Brasília, no entanto, parece que eles não
têm a mesma noção. Já que a natureza destes impressos pagos a expensas do reles
contribuinte entra na conta dos dispêndios pantagruélicos torrando sem dó nem
piedade as horas de trabalho de milhões de brasileiros.
Entre
todas, uma das mais criativas é essa modalidade de patrimonialismo, um
patrimonialismo pós-moderno, que consiste em empenhar recursos do Erário para
financiar publicidade do politico. Se pensar muito nisso, a pessoa física
tentará arrancar os minguados cabelos que não foram tributados.
A
cada ano, os governos todos, municipais, estaduais e federal, numa raríssima
unanimidade suprapartidária, consomem em conjunto alguns bilhões de reais para
promover espetacularmente o que consideram seus grandes feitos.
Fazem
publicidade paga de si mesmos, com o único objetivo de ganhar votos. Mas quem
paga a conta são as milhões de pessoas físicas com trabalho honesto. Pense bem;
quantos brasileiros enfrentaram jornadas extenuantes para financiar não só
essas luxuosas brochuras, mas também os filmetes que vemos volta e meia a saracotear
em horário nobre televisivo, nos quais as autoridades públicas posam alegres e
saltitantes como se fossem um elenco de novela das 9.
É
justo que as economias de tantos milhões de pessoas físicas sejam consumidas
assim, sem a menor cerimônia, para atender a interesses meramente partidários
de tão poucos? Fazer o quê? Protestar nas ruas de novo e ver que o que se
recebeu foi um recesso branco que mais parece o avestruz que enterra a cabeça
para não ver o povo clamar? Ou as propostas milagrosas apresentadas pela presidente,
já nasceram fadadas ao sepultamento?
Então
meu caro leitor, vamos continuar a financiar estas epopeias de nossos bravos políticos.
Deixemos que palmo a palmo disputem com Homero, Virgílio, Dante ou Camões a
imortalização de seus bravos feitos, ilustrados nas capengas fotografias que
personificam os quase deuses. Sendo que nós pobres mortais oferecemos em
holocausto todo santo ano as nossas contribuições ao fisco para perpetuar este
olimpo de deuses para quem ninguém mais reza, apenas atura suas imagens moldada
em barro, dos pés a cabeça!