O início do período republicano da história
do Brasil foi marcado por vários conflitos e revoltas populares. O Rio de
Janeiro não escapou desta situação. Em 1904, estourou um movimento de caráter
popular. O motivo que desencadeou a revolta foi a campanha de vacinação
obrigatória, imposta pelo governo federal, contra a varíola.
As manifestações populares e conflitos
espalham-se pelas ruas da capital brasileira. Populares destruíram bondes,
apedrejaram prédios públicos e espalharam a desordem pela cidade. Em 16 de
novembro de 1904, o presidente Rodrigues Alves revogou a lei da vacinação
obrigatória, colocando nas ruas o exército, a marinha e a polícia para acabar
com os tumultos. Em poucos dias a cidade voltava a calma e a ordem.
Da mesma maneira truculenta, o que era
polêmico, hoje é comum, como tomar vacina. Talvez por isso, com esse afã de
revolta, um dos principais argumentos usados pelos opositores do casamento gay
soa tão estúpido que é difícil de entender por que alguém perderia tempo em
debatê-lo. Para os inimigos da causa LGBT, permitir a união civil entre pessoas
do mesmo sexo provocaria uma banalização do matrimônio heterossexual e
enfraqueceria os laços de famílias nesse padrão. Eu sei, é ridículo, mas a
ciência deu um passo atrás e se debruçou sobre o assunto.
Imaginar que
um homem e uma mulher deixariam de se casar aqui porque dois homens se casaram
acolá é tão delirante que chega a ser penoso pensar em entrar numa discussão
com alguém que raciocina assim. Mas no contexto da batalha jurídica da ação
coletiva que culminou com liberação
do casamento gay nos EUA, seria de grande ajuda provar por A mais B que isso
estava errado. Os defensores dessa ideia, afinal, poderiam se esconder atrás da
falta de evidências.
Quem teve a
paciência de elaborar uma pesquisa para testar o argumento de que a união
homossexual afetaria o casamento hétero foram as sanitaristas Alexis Dinno e
Chelsea Whitney, da Universidade Estadual de Portland, no Oregon. Taxas de
casamentos são um tema comum em estudos de saúde pública porque pessoas casadas
são em geral mais saudáveis do que aquelas que vivem sozinhas. O resultado de
seu trabalho foi publicado em junho de 2013, exatamente um mês antes de o casal
James Obergefell e John Arthur, de Ohio, entrar na justiça com o pedido de
reconhecimento de seu casamento, no processo que daria origem à ação coletiva.
Para saber se
a realização de casamentos entre pessoas do mesmo sexo realmente provocaria uma
redução no número de casamentos heterossexuais ou um aumento no número de
divórcios as pesquisadoras foram atrás de registros matrimoniais nos 50 estados
americanos e analisaram o que ocorreu durante vinte anos, no período entre 1989
e 2009.
As cientistas
se valeram do fato de que alguns estados tinham aprovado leis permitindo o a
união homossexual durante esse período. Seria possível, então, não apenas
comparar estados pró e contra a causa gay mas também analisar como um mesmo
estado reagia a duas legislações diferentes em momentos distintos.
A conta foi
difícil de fazer, por requerer uma série de correções estatísticas para
compensar lacunas em meio aos dados compilados, mas a conclusão não foi
exatamente uma surpresa: assim como a revolta da vacina, as polêmicas criadas
pelos “achistas” tendem a cair em função do esclarecimento aos menos esclarecidos
quando estudos científicos desmistificam o preconceito e a desinformação.