Entre os anos de 1942 e 1945, quando a produção de borracha da Malásia não era suficiente para abastecer o projeto bélico dos aliados nos últimos contornos da Segunda Guerra Mundial, cerca de 75 mil homens, principalmente nordestinos, foram trazidos à Amazônia em meio ao recrudescimento das atividades nos seringais.
Recrutados pelo SEMTA (Serviço Especial de Mobilização de Trabalhadores para Amazônia) em meio a uma propaganda intensa e efusiva, chegaram aos milhares por dia no desespero do governo brasileiro em cumprir a meta de 100 mil toneladas de borracha acordada junto aos Estados Unidos.
Fardados tais quais soldados e espalhados pela região, sobretudo no estado no Acre, a grande maioria desses trabalhadores experimentou no pós-guerra o abandono por parte de sua pátria. Hoje, em avançada idade, muitos deles sequer sabem possuir direito ao benefício de dois salários mínimos mensais, o que, para quem já compartilhou da miséria e de situações de extremo risco de morte, pode significar uma aposentadoria bem mais tranquila.
O benefício, garantido pela Constituição Federal de 1988, possui caráter assistencial, portanto não concedido em razão de vínculo de contribuição, ainda que pago pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). Pode também ser obtido pelos dependentes dos soldados, em caso de morte ou de incapacidade para obtê-lo, que estejam em situação de extrema pobreza, sem renda própria ou sem receber qualquer benefício previdenciário. O benefício; vale lembrar, não é retroativo, valendo somente a partir de seu requerimento junto ao INSS. De acordo com o procurador federal, o benefício é um reconhecimento especial das pessoas que contribuíram dentro dos esforços de guerra. Ocorre que muitos desses trabalhadores sequer chegaram a entrar no seringal, tendo contribuído em atividades de apoio à estrutura-base para produção da borracha, como a produção de banha e farinha e a construção de estradas para escoamento dos produtos. A estes, a Constituição não destinou artigo algum.
Por outro lado, no Tapajós há casos de gente que havia entrado espontaneamente na economia de guerra, tanto na balata; os balatais eram comuns na região Oeste, pelos municípios de Monte Alegre, Almeirim, Alenquer, quanto na seringa. Eles acabaram tendo acesso ao benefício. E a economia da borracha acabou virando uma alternativa econômica, tanto para os nativos quanto para os comerciantes.
Isso só foi possível, porque a constituição especifica a condição de convocado. Para ter acesso ao benefício, o trabalhador precisa fazer a comprovação de acordo com a legislação previdenciária, pelo que se chama 'início razoável de prova material'. O dispositivo, que seria criado apenas em 1991; tamanha as dificuldades de comprovação material, permite que fotografias ou provas indiretas, mais o depoimento de três testemunhas, garanta o benefício. Muitos desses trabalhadores sequer sabiam ler. Amontoados nos pousos e nas colocações, como o pouso do Tapanã, em Belém, abrigava até 3 mil homens na chegada à Amazônia, muitos armazenaram pífias ou nenhuma prova documental específica, como o documento de convocação.
É uma expressão que não pode ser interpretada de maneira estreita. Uma fotografia, uma nota, um recibo em que esteja comprovada a compra de equipamentos, para a extração do látex, nos regatões, e até mesmo documentos privados, como o boletim do filho do seringueiro em que vinha discriminada a profissão do pai, podem ser utilizados como início razoável de prova documental. Mas o objeto tem que ser complementado por três testemunhos junto ao INSS, que abrirá justificação administrativa. É raro conseguir sem isso, a não ser que haja prova contundente, como o documento de convocação. Apenas para efeito de comparação, mesmo mais de 20 anos após a criação do dispositivo, muito pouco dos trabalhadores remanescentes, conseguiram o benefício apenas com base em documentação sólida. Testemunhas mesmo, só o tempo e a história...