quarta-feira, 9 de março de 2011

Asche zu Asche


As cinzas estão nas mãos de quem as produziu, quer seja de um débil cigarro, quer seja num crematório. Antes significava o fim do carnaval, o silêncio, o encerramento de canções e a turba a voltar para casa sem as brincadeiras felizes e as cinzas a voar ao sabor do vento, mostrando o que restou.

Antes os sorrisos, os beijos e abraços, motivados pela folia, pelos excessos, estes se foram. Ninguém mais se beija ou abraça sob as vassourinhas e frevos. Mas no entanto precisamos reviver, é preciso cantar, é necessário sorrir, é valido gritar de alegria e alardear à cidade que as cinzas o vento leva mas a alegria não.

Enfim, a tristeza que a gente tem, um dia se acaba, o sorriso vai voltar, a esperança vai surgir. O povo vai voltar a dançar. Alegria e dança se voltam a origem, espalham as cinza como ao pó dos móveis abandonados e por muito esquecidos na melancolia das cinzas.

Advindo com a ida das cinzas vem o amor, e tanto amor para amar que nem se sabe por onde ele começa em um grande balaio, onde os gatos se mesclam e se interminam em burburinhos. Quem me dera viver para ver, e brincar tantos carnavais, com a beleza dos velhos carnavais, das marchas chorosas ou dos lamentos de pierrot, arlequim e colombina.

O clamor e o canto do povo pelas ruas, equinas, vielas estreitas ou largas avenidas, palco do inominável, da festa dos loucos e tolos, da festa de Momo e da carne, da lascívia liberta ou da redenção encontrada. Enfim...

As cinzas voam, um momento se passa, deixemos o anjo passar, afinal que leve com ele as saudades da turba alegre a descer e subir ruas sob a ode dos sopros, bumbos e atabaques. Que seja igual a Vinicius, eterno enquanto dure, perpétuo e para sempre. Hiperbólico até a alma, superado até o limite.

Mais uma vez o povo cantando seu canto de paz. Seu canto de paz...

É, ja sinto a paz. Cinza às cinzas, pó ao pó.

terça-feira, 8 de março de 2011

Mardi gras e a Gorda


A folia anda solta por todas as esquinas, becos, mangues e cantos. Terça feira gorda, que antecede o fim da folia de Momo, transcende o imaginário popular. Ainda ontem (plena segunda feira de carnaval!) no trabalho, olhava as faces decepcionadas dos meus correligionários, impacientes por serem os únicos seres vivos (apesar de alguns insetos) a estarem trabalhando naquele dia. Com os corredores enormes da Universidade, vazios e seus ocupantes habituais em plena esbórnia momesca, meus pobres assistentes se perguntavam: por quê?

Lá por volta das 16 horas pedi um café, preto e amargo como sempre, e como quem não quer nada a copeira começou o “vai da valsa” querendo saber se trabalharíamos hoje. Além de perguntas amenas, para chegar ao grande filé da dúvida que provavelmente pairava na cabeça de todos da equipe que a nomeou porta-voz das inquietações dos demais.

Aproveitando-se da oportunidade (já que a mesma faz o ladrão), igual a um felino que sempre consegue tudo o que quer; inclusive agradar antes do bote. Ela chegou-se a mim e com a cara parecendo o personagem Gato de Botas do desenho Shrek, percebi o bote e me esquivei com uma pergunta que desarmou qualquer intenção de contenda:

_E então o que você vai fazer na folga do feriado amanhã?

Assim com o susto da pergunta inesperada, ela se desfez em gentilezas e afirmou para mim que tinha a pretensão de ir a igreja. Como no auto dos costumes do seio religioso, supus na hora que fosse evangélica, afinal neste período as igrejas catolicas estão fechadas até a missa das cinzas.

Foi então que me foi disparada a pergunta que motiva o artigo de hoje: _Doutor, por que chamam esse dia de terça-feira gorda? É por causa do rei Momo?

Com a quietude de quem já ouvira perguntas tão semelhantes e como o diletante que sempre se prestou ao acúmulo do conhecimento de almanaque. Parti para o ataque e chutei a gol.

_Dona Silvia, estes períodos são chamados de “gordos”, por que antecedem a quaresma, que por sua vez antecede o período da semana santa. Antes a igreja era intolerante quanto a folias da carne, como era pejorativamente chamada esta manifestação pagã.

Mas com o tempo e pelos costumes, acabou se tornando tolerante e classificando o ato não mais como comemoração pagã de adoração a deuses diversos. Mas com a condição que se guardasse o jejum da quaresma. O que acabou então acontecendo. Cometiam-se os excessos (que perduram até hoje!) como a gula e a lascívia. Sendo que na quarta feira à abertura das portas da igreja para a missa de consagração das cinzas, dever-se-ia voltar ao hábito da fé.

O Carnem levare ou Carne vale; algo como que “adeus à carne” que acabou gerando a corruptela Carnaval, advém deste período onde tudo pode, onde tudo é gordo e o ícone é Momo, mais gordo, melhor. Comer, beber, fornicar e gozar (no sentido geral!).

Enfim como um catedrático que fecha o grande tomo do saber divino, encerrei a lição à copeira e ganhei uma em troca:

_Doutor, pra quem entende tanto de carnaval, acho que o senhor poderia se divertir mais no ano que vem e fazer igual ao diretor antes do senhor. Que a gente só via uma semana depois do carnaval...

Ah, sábios tempos os de Salomão, valei-me Momo!

segunda-feira, 7 de março de 2011

A dificil arte das omissões

Em certos momentos refletimos o quanto as coisas podem ser resolvidas pelo poder de nossas ações, palavras e gestos. Sabemos que podemos fazer qualquer coisa e alterar o curso dos acontecimentos mudando apenas um grão de areia da sua posição original no quadro.
É difícil imaginar o quanto crescemos com essa concepção de que somos deuses. Afinal: "Não sabeis que sois divinos?" Odeio essa frase piegas da renascença. Ela acaba pregando que tudo podemos e que tudo está ao nosso alcance. Mas isso não é para todos os mortais. Não cabe a plebe gerir seus destinos. Nem aos mortais decidir o que é bom para eles.
Correndo o risco de ser tachado de anti-semita, mas devemos ser conscientes de que vivemos a ilusão de que governamos nossas vidas. De que basta querer e como num passe de mágica todos os anseios de nossas almas tem sua realização concretizada. Isso é a mais pura bobagem, quer queira, quer não nossa felicidade depende dos outros, as vezes de pessoas que nem conhecemos as vezes de pessoas que nem estão intrinsecamente ligadas a nossa felicidade, mas de certa forma, como uma teia absurda de emaranhados toscos traçados pelas Parcas e suas piadas toscas, estamos emaranhados nesta trama.
Fico revoltado quando vejo que meu futuro, os planos, os amores as certezas, dependem de pessoas e de acontecimentos tão esdrúxulos ao contesto que se pode pensar o que se teria a ver com isso. Não posso envolver o destino nisso, afinal envolve-lo seria o mesmo que culpar Sócrates pela dengue 4. Por isso acho que temos que aprender a contornar esses intermediários da felicidade.
Por fim antes que eles acabem com anos de planos e de metas a fim de nos tornar grandes fantoches infelizes tentando compensar suas tristezas com outras tristezas gerando mais tristezas e insatisfações. Fazendo-nos assim verdadeiros príncipes da arte de omitir a felicidade de nós mesmos.
Tenho me odiado pelas omissões que sou obrigado a fazer... Me envergonho disso!

domingo, 6 de março de 2011

Entre a linha da loucura e genialidade


Sempre se diz que de médico e de louco todo mundo tem um pouco. Mas fico me imaginando às vezes o quanto a porção Jekyll ou a porção Hyde prevalecem sobrepondo tudo o que acreditamos ou tudo o que negamos por mais concreto que seja.
De vez em quando me coloco nestas situações onde por mais que eu lute para conter a porção selvagem, animalesca. Ela acaba aflorando e dominando a razão nem que sejam por alguns minutos, e minutos estes que podem destruir uma vida inteira.
Instinto. Milhares de anos de evolução para nos livrarmos dele e ele ainda nos persegue, quer sendo na sobrevivência, preservação ou até mesmo no sexo. E em cada seguimento é capaz de fazer valas profundas que às vezes beiram o arrependimento. Sábio Dr. Henry Jekyll ao conseguir dividir estes demônios da razão e do calor das emoções em sua fórmula mágica para as personalidades perdidas. Mas a fantasia de Louis Stevenson não nos ajuda muito a lidar com a crise de personalidade real e sim a entender que devemos evitar o máximo a tentação de buscá-la.
Sendo assim que a inocente chave de desencadeio dos males das múltiplas personalidades eseja para todo sempre enterrada no fundo, no canto mais desconhecido do Id para que enfim as atormentadas almas busquem a paz e a calma que suas almas inquietas que perscrutam a luz de que necessitam.

Excelente feriado de carnaval, vou enterrar minha chave também, só assim me livro das tentações que uma saudade cria no vazio da gente.

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