Durante
esta semana um fato curioso martelou-me o juízo. Se toda a bancada de senadores
do Amapá manifestou-se como oposição aberta tanto a gestão de Dilma Roussef e
de Waldez Góes, que fruto isso rende a um dos estados mais isolados dos centros
do poder?
Afinal
cabe às oposições, como é óbvio e quase ridículo de escrever, se oporem ao
governo. Mas para tal precisam afirmar posições, pois, se não falam em nome de
alguma causa, alguma política e alguns valores, as vozes se perdem no
burburinho das maledicências diárias sem chegar aos ouvidos do povo. Todas as
vozes se confundem e não faltará quem diga – pois dizem mesmo sem ser certo –
que todos, governo e oposição, são farinhas do mesmo saco, no fundo
“políticos”. E o que se pode esperar dos políticos, pensa o povo, senão a busca
de vantagens pessoais, quando não clientelismo e corrupção?
Diante
do autoritarismo era mais fácil fincar estacas em um terreno político e alvejar
o outro lado. Na situação presente, as dificuldades são maiores. Isso graças à
convergência entre dois processos não totalmente independentes: o “triunfo do
capitalismo” entre nós (sob sua forma global, diga-se) e a adesão progressiva –
no começo envergonhada e por fim mais deslavada à nova ordem e a suas
ideologias.
Uma
complexidade crescente a partir dos primeiros passos do governo Dilma que, com
estilo até agora contrastante com o do antecessor, pode envolver parte das
classes médias. Estas, a despeito dos êxitos econômicos e da publicidade
desbragada do governo anterior, mantiveram certa reserva diante de Lula. Esta
reserva pode diminuir com relação ao governo atual se ele, seja por que razão
for, comportar-se de maneira distinta do governo anterior.
Quanto
a Waldez, ainda é cedo para avaliar a consistência de mudanças no estilo de
governar, já que os tempos são outros e o clima e a temperatura do momento são
bem diferentes dos mandatos já exercidos. Estamos no início do mandato e os
sinais de novos rumos dados até agora são insuficientes para avaliar o percurso
futuro.
Antes
de especificar estes argumentos, esclareço que a maior complexidade para as
oposições se firmarem no quadro atual é comparando com o que ocorreu no regime
autoritário, e mesmo com o petismo durante o governo FHC, pois o PT mantinha
uma retórica semianticapitalista que não diminui a importância de fincar a
oposição no terreno político e dos valores, para que não se perca no
oportunismo nem perca eficácia e sentido, aumentando o desânimo que leva à
inação.
É
preciso, portanto, refazer caminhos, a começar pelo reconhecimento da derrota:
uma oposição que perde três disputas presidenciais não pode se acomodar com a
falta de autocrítica e insistir em escusas que jogam a responsabilidade pelos
fracassos no terreno “do outro”. Não estou, portanto, utilizando o que disse
acima para justificar certa perplexidade das oposições, mas para situar melhor
o campo no qual se devem mover.
O
mesmo aconteceu no Amapá quando o “socialismo de gaveta” assumiu o governo e
teve ações incoerentes combatidas pelo ex-senador Gilvam Borges que conseguiu
mobilizar um bloco de oposição multipartidário e ainda assim conseguir coesão
de se opor não por se opor, mas sim com um projeto de governo futuro que acabou
se concretizando na última eleição.
Já
em nível nacional, segmentos numerosos das oposições de hoje, mesmo no PSDB,
aceitaram a modernização representada pelo governo FHC com dor de consciência,
pois sentiam bater no coração as mensagens atrasadas do esquerdismo petista ou
de sua leniência com o empreguismo estatal.
Não
reivindicaram com força, por isso mesmo, os feitos da modernização econômica e
do fortalecimento das instituições, fato muito bem exemplificado pela
displicência em defender os êxitos da privatização ou as políticas saneadoras,
ou de recusar com vigor a mentira repetida de que houve compra de votos pelo
governo para a aprovação da emenda da reeleição, ou de denunciar atrasos
institucionais, como a perda de autonomia e importância das agências
reguladoras.
O
estupendo sucesso da Vale, da Embraer ou das teles e da Rede Ferroviária
sucumbiu no murmúrio maledicente de “privatarias” que não existiram. A política
de valorização do salário mínimo, que se iniciou no governo Itamar Franco e se
firmou no do PSDB, virou glória do petismo que era oposição ferrenha a tudo
isso!
As
políticas compensatórias iniciadas no governo do PSDB – as bolsas – que o
próprio Lula acusava de serem esmolas e quase naufragaram no natimorto Fome
Zero – voltaram a brilhar na boca de Lula, pai dos pobres, diante do silêncio
da oposição e deslumbramento do país e… do mundo!
As
vozes dos setores mais vigorosos da oposição se estiolaram, entretanto, nos
muros do Congresso e este perdeu força política e capacidade de ressonância. Os
partidos se transformaram em clubes congressuais, abandonando as ruas; muitos
parlamentares trocaram o exercício do poder no Congresso por um prato de
lentilhas: a cada nova negociação para assegurar a “governabilidade”, mais
vantagens recebem os congressistas e menos força político-transformadora tem o
Congresso.
Neste
sentido, diminuiu o papel político dos governadores, bastião do oposicionismo
em estados importantes, pois a relação entre prefeituras e governo federal
saltou os governos estaduais e passou a se dar mais diretamente com a
presidência da República, por meio de uma secretaria especial colada ao
gabinete presidencial.
Então,
ainda havia indignação diante das denúncias que a mídia fazia e os partidos
ecoavam no Parlamento. Pouco a pouco, embora a mídia continue a fazer
denúncias, a própria opinião pública, isto é, os setores da opinião nacional
que recebem informações, como que se anestesiou. Os cidadãos cansaram de ouvir
tanto horror perante os céus sem que nada mude. Diante deste quadro, o que
podem fazer as oposições?
Em
primeiro lugar, não manter ilusões: é pouco o que os partidos podem fazer para
que a voz de seus parlamentares alcance a sociedade. É preciso que as oposições
se deem conta de que existe um público distinto do que se prende ao jogo
político tradicional e ao que é mais atingido pelos mecanismos governamentais
de difusão televisiva e midiática em geral.
As
oposições se baseiam em partidos não propriamente mobilizadores de massas. A
definição de qual é o outro público a ser alcançado pelas oposições e como
fazer para chegar até ele e ampliar a audiência crítica é fundamental.
No
parlamento estadual não é diferente, criou-se um miclobloco de oposição, cujo
único papel pelo jeito será de dizer não a tudo o que for proposto pelo
governo. E pelo andar da carruagem o bloco senatorial do Amapá vai fazer o
mesmo papel de do “Do Contra”, aquele personagem de Maurício de Sousa, que para
tudo o que é proposto ele é contra, apenas por ser, mas sem nenhuma
justificativa plausível, bloqueando e empurrando, com que motivo não se babe ao
certo, mas com certeza não deve ser para o Amapá...
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