domingo, 22 de agosto de 2010

Há de se ter muita fé e paciência


Quando Benjamin Moser, o festejado autor americano de “Clarice,” falou no palco da última Flip que “os brasileiros não deveriam se envergonhar de Paulo Coelho, pois ele é o segundo escritor mais lido no mundo”, vaias veementes surgiram de alguns pontos da platéia. Moser não pareceu entender muito bem. Mais provável é que nunca tenha lido Coelho, um alquimista a anos-luz da magia verbal de sua adorada Lispector.
Alquimista sim. Afinal consegue melhor que ninguém, transformar histórias bobas em ouro. “O Aleph” é mais uma prova desse talento inegável. Para quem, como Moser, gosta de literatura densa, inventiva, rica em subtextos, inspiradora e que não se esgota em uma leitura, o livro é intragável. No entanto, tem alguma chance de agradar os milhões de fãs espalhados pelo planeta ou seria mais adequado dizer “pelo universo”? Fãs que não se importam de ter a inteligência subestimada, pois querem apenas ser conduzidos e confirmar suas próprias crenças. Por que ser crítico com alguém que só diz o que se espera ouvir (ler)?
Mas a ironia, nesse caso, além de óbvia, é inútil. Pois o ocupante da cadeira 21 da Academia Brasileira de Letras está claramente acima de ironias, às quais responde com números impressionantes, o carinho leal dos leitores e uma sabedoria supostamente superior. E não se pode negar-lhe o mérito de abrir as portas da percepção literária a muita gente que talvez nunca tivesse aberto um livro e que, a partir daí, tomou gosto. Então qual o segredo? Tudo bem, ele faz chover. Mas é sempre no molhado. E esse “Aleph”, emprestado de tradições milenares, mas também do bruxo “rival” (e sumamente irônico) Borges, é, com o perdão de mais uma ingênua ironia, uma tempestade na enchente. É mais uma variante do mito do herói, ou do “Pássaro Azul” de Maeterlink, em que é preciso cobrir grandes distâncias para descobrir o tesouro que sempre esteve ao seu lado.
Particularmente acho um exercício desnecessário de paciência aturar as 256 páginas de tormento pseudo-literário, afinal apesar do sucesso, J.K. Rowling e Dan Brown também venderam mais que Saramago, mas com certeza não vão se igualar nunca a beleza de uma construção memorável.
A espinha dorsal do livro se curva sob o peso da banalidade do texto. Não há nenhum cuidado com o chamado “fazer literário” um garoto ou garota de 14 anos seria capaz de escrever 70% do livro. Nem parece ser esse o objetivo de Coelho. Literatura não é com ele. Como coloca em “O Aleph”, para escrever basta amar. Sua crise de fé, crise no casamento e bloqueio para escrever elementos que se confundem nas exaustivas 256 páginas do livro seriam, então, falta de amor. Ou falta de perdão. O infinito Aleph já foi infinitamente melhor representado.

Para quem se dispuser a tal fardo... Bom domingo

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