quinta-feira, 2 de setembro de 2010

Dalai 1


Vermelho. Para onde quer que eu olhasse era só o que via no aeroporto internacional de Beijing (Pequim) desde que há intermináveis 15 minutos aguardava minhas malas aparecerem na esteira. Não havia meio-termo. Tinha realmente deixado toda e qualquer referência no continente europeu. Aqui, olhos puxados que em nada lembram os das colônias espalhadas por São Paulo, disciplina no andar, fala ininteligível, escrita ainda mais incompreensível. E o vermelho. Dominante, intimidador, complementar às fardas dos militares dispostos na seção de imigração e que pareciam enxergar o meu quase absoluto temor.
O dia anterior havia sido tranqüilo em Londres. Roteiro básico e obrigatório: Westminster, Buckingham, Big Ben, Tâmisa, ônibus de dois andares, Soho, táxis clássicos moderníssimos, Heathrow, vôo. E pesadelo. Acordado e absurdamente prosaico.
Uma viagem ao oriente pode requerer pré-requisitos mais nobres como necessidade de auto-descobrimento, evolução espiritual, vocação aventureira, mas há uma lista de itens mundanos obrigatórios para a viagem: a minha era extremamente detalhada e quase interminável. Uma rota que se anuncia proibida justifica a minúcia do relatório que recebi da agência que organizou a expedição e que lembrei de checar assim que o avião deixou Londres: Listaram praticamente todos os itens de minha bagagem.
Entre as centenas de passageiros do Boeing 747-400 da British Airways com destino a Beijing no início da noite de 31 de agosto havia apenas um brasileiro. Alguém que, do assento 28G, com os olhos arregalados observava o documento a ser preenchido sobre a febre amarela, sem ele não podemos descer em solo chinês.
Proibido. Febre-amarela. Declaração de saúde. Vacinação. A cerca de 1.200km/h, acima das nuvens, minha única lembrança era de um pequeno cartão amarelo esquecido sobre o criado mudo de meu apartamento. Se era aventura o que procurava ao deixar o Brasil, ela começava ali, com a total e irrestrita incapacidade de mudar a situação. E ainda faltavam mais de 15 horas até chegar ao continente asiático.
Na esteira do aeroporto de Beijing, é a terceira vez que uma de minhas malas passam por mim. Um funcionário da companhia aérea faz menção de ajudar, mas permanece apenas observando o rapaz que aperta com toda a força o papel com a declaração de saúde para o governo chinês, sem tirar os olhos das paredes vermelhas.

Estou na China. Proibido de pisar no solo que é a porta de entrada para o reino tibetano.

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