A globalização vem produzindo malefícios de todo tipo: econômicos, sociais, culturais, espaciais e políticos. Isso tem sido amplamente discutido nos meios acadêmicos. O malefício-mor, porém, aquele que é mais importante do que qualquer outro, tem recebido pouca ou nenhuma atenção. Refiro-me ao fato de que a globalização inclui, no seu “saco de maldades”, a destruição das condições que tornam possível a existência do regime democrático.
Daí resulta que estamos sendo tangidos pela globalização como um rebanho pacato. Nada podemos fazer contra seus aspectos negativos na medida em que não dispomos dos instrumentos de luta que só o regime democrático poderia nos proporcionar. Quanto mais a globalização avança, mais distantes ficamos da realização do ideal democrático. Vale dizer, mais impotentes nos tornamos. Somos os sem democracia.
Longe de nós, porém, a ideia de participar de algum movimento contra esse estado de coisas. Estamos tão alienados que nem sequer sabemos mais qual é o significado da palavra democracia. Não sabemos, nem fazemos questão de saber.
Dentre as mudanças que estão afetando nosso sistema político, destaco as relações entre o poder executivo e o legislativo amapaenses, onde um clima beligerante instalou-se de tal maneira entre os litigantes, que mesmo as palavras de insólita humildade pronunciadas pelas partes, não convence de que os próximos três anos serão difíceis para a democracia amapaense.
As consequências ainda não mensuradas pelos dirigentes dos poderes em guerra serão visíveis dentro em breve, pois um estado frágil e de economia tão subserviente á União, tende a sofrer um rápido processo de esvaziamento perdendo poder, recursos, funções e o prestígio. Logo faltarão condições para controlar suas finanças já que preços cruciais como os de câmbio, dos juros, das tarifas e das commodities, assim como o tamanho do déficit nos orçamentos e no balanço de pagamentos, não constituem matérias suscetíveis de serem definidas por meio de decisões exclusivamente internas e soberanas.
Faltará também capacidade para atuar como motor do desenvolvimento já que as decisões de investimento, assim como a geração de progresso técnico submetem-se cada vez menos a critérios decorrentes de algum tipo de planejamento governamental. E também da capacidade técnica dos articuladores, o que parece não existir em numero satisfatório em ambos os lados.
Faltarão finalmente, os meios para atender, de modo satisfatório, as necessidades de educação, saúde, habitação, seguridade, meio ambiente e segurança pública. Até mesmo no que diz respeito ao provimento de capital social básico (estradas, portos, saneamento e energia) pouco se pode esperar do Estado hoje aviltado e exaurido, entregue à ganância de uma economia desengastada, liberta dos condicionamentos sociais e pautada apenas por suas próprias leis do movimento.
Em lugar do desenvolvimento, do pleno emprego e do bem-estar, o Estado, acima de tudo terá que cuidar de sua credibilidade diante dos mercados financeiros, um tribunal de cujas decisões não cabe recurso. Para tornar as coisas ainda bem piores, acontece que a ação do Estado é vista como contraproducente pelos bem sucedidos e integrados e como insuficiente pelos desmobilizados e desprotegidos: essas duas percepções convergem na direção da deslegitimação do poder administrativo e da desvalorização da política.
A mudança radical é a obsolescência da crença na democracia. Para usar um termo da moda, dinossauros não são apenas os estadistas, os nacionalistas ou os socialistas: os democratas também viraram seres do passado, pregadores de antigos ideais. Os poucos que sobraram não conseguem compreender, nem muito menos aceitar o fato de que as condições atuais, aqui como alhures, são francamente desfavoráveis à implantação e ao florescimento do regimento político democrático.
A democracia requer, como condição sine qua non, a existência de um Estado-nação soberana. A prova disso é dada pelo sistema colonial: se o “demo” está na colônia e a “cracia” na metrópole, não pode o povo da colônia participar do processo decisório central que, por definição, transcorre fora do seu alcance. A teoria democrática sempre pressupôs que o autogoverno é possível porque, sendo soberano, o Estado-nação detém o controle de seu próprio destino e está sujeito apenas aos limites que lhe são impostos por atores, agências e forças que operam no interior de suas fronteiras territoriais. Desde que o Estado seja soberano, a origem das mudanças sociais encontra-se em processos internos à sociedade.
Rogo às partes para que reconsiderem seus posicionamentos pessoais e comecem a fazer suas obras baseadas no poder que lhes delegou o combustível da democracia, o eleitor. Períodos absolutistas e ações despóticas, mesmo que supostamente esclarecidas, tem o hábito de enfurecer as massas mesmo em tempos modernos, basta que lhes tirem o pão, já que o circo é perene...
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