quinta-feira, 29 de dezembro de 2011

Entrevista da semana - Charles Borges

O Coisas da Vida abre seu quadro de entrevistas, senão de maneira justa, com seu criador. Em um começo de noite descontraída, em seu apartamento no Centro de Macapá, entrevistamos o Dr. Charles Borges que foi muito pragmático nos posicionamentos sobre os temas que tem acontecido no Brasil e no mundo. Sob um fundo leve de aquarela, na voz de Toquinho e um cafezinho, que se tornou sua marca registrada, colecionamos algumas pérolas deste controverso cronista...

Coisas da Vida: Você escreve sobre quase todos os temas que envolvem a atualidade de uma maneira que às vezes deixa o viés imparcial que é característico dos jornalistas. Não teme ficar rotulado como ranzinza pelas posições um pouco radicais?

Charles Borges: Na verdade eu não sou jornalista, sou engenheiro químico! Mas louvo os que sabem escrever com maestria sem tomar partidos, embora isso seja um talento raro para os dias de hoje onde a maioria dos profissionais sérios está em vias de se aposentar e os novos tentam provar algo para si mesmos e os coluna do meio, ah esses adoram tomar partidos...  Vou continuar na imparcialidade e se me chamam de ranzinza, posso arranjar uma ponta no desenho dos anões da Disney.

Coisas da Vida: Depois de 5 livros bem sucedidos em áreas específicas das ciências, como é lançar um livro de crônicas?

Charles Borges: Na verdade esta não é a minha primeira incursão literária fora do meu campo profissional. Quando estava na docência, não concordava com a mania dos educadores de sistematizar tudo em cima de Piaget e Vigotski. Resolvi relembrar a infância e ai saiu o "Para não atirar o pau no gato" que foi um pedido de socorro dos nostálgicos para as cantigas de roda infantis. Acredito ter sido feliz na ideia, até mesmo por que a indicação para o Jabuti, embora eu não tenha levado, tenha sido válida para incentivar a apostar em outros ramos literários sem pretensões de best seller.

Coisas da Vida: A maior parte da sua vida foi indo e voltando para o Brasil, isso de alguma maneira contribuiu para se apurar uma visão mais crítica sobre o país?

Charles Borges: Minhas idas e vindas sempre foram baseadas em um propósito, afinal estudei lá e cá desde a década de 80. Meu pai era oficial da marinha mercante e isso sempre nos deu uma vida nômade. Minha primeira incursão fora do Brasil foi para estudar em Hamburgo, onde passei uns bons anos e voltei alguns anos depois para fazer o doutorado. Não dá para perder a identidade cultural quando você tem personalidade, mas com certeza você desenvolve um olhar mais crítico, não para as futilidades como opulências e ostentações. Mas na relação do que está certo e o que pode melhorar no seu país com base na sua visão de outras realidades, um olhar estrangeiro como retratou o Bernardo Oyarzun em sua obra homônima.

Coisas da Vida: As suas opiniões políticas são explicitamente neutras em todos os seus textos que abordam o tema. Não é difícil não tomar partido?

Charles Borges: Nunca vivi em uma terra onde se respirasse tanto o éter da política quanto o Amapá. Aqui praticamente do morador mais humilde ao mais condecorado opina sobre o tema. Vive-se uma dicotomia muito grande em função de uma dualidade partidária. Quase me sinto sob o julgo do MDB e o ARENA, quando o bipartidarismo maniqueísta era lei. É Fácil não tomar partido quando se vive à margem do erário informal. Quando você depende de alguma maneira do poder público paralelo ao modelo oficial, você acaba sucumbindo às mazelas da politica partidária.

Coisas da Vida: O Amapá não é uma passagem curiosa da sua vida? Como veio parar aqui?

Charles Borges: Na verdade vim passar uma chuva. Sou um paraense que perdeu há muito tempo a sua natureza nortista para se compartilhar com o mundo e tudo o que ele oferta em conhecimento. O Amapá apareceu como um desafio de mudar o que não quer ser mudado. Há dez anos vim para passar três meses e acabei ficando, constituí família e fiz amigos. Vou, passo uma temporada fora, mas sempre volto.

Coisas da Vida: Os seus objetivos no Amapá foram bem sucedidos?

Charles Borges: Com certeza, atuei na docência durante mais de oito anos, quando cheguei em Macapá a mentalidade dos adolescentes era simplesmente fazer o ensino superior fora do Estado e nunca mais voltar. Mesmo tendo atuado com uma massa muito pequena, cerca de sete mil indivíduos. Acredito ter conseguido mostrar que existem caminhos melhores do que trabalhar para o governo e fugir do Estado em que as oportunidades esses mesmos jovens seriam capazes de criar.

Coisas da Vida: Você foi um defensor veemente do empreendedorismo, mesmo não tendo sido empreendedor, como dá para defender uma politica que não se pratica?

Charles Borges: Como assim não fui empreendedor?  Me dediquei em grande parte dessa empreitada amapaense ao empreendedorismo, quer seja atuando paralelo ao SEBRAE que considero elitista demais, ou em atos isolados, como a implantação da disciplina “Ética e empreendedorismo” no currículo das escolas e faculdades onde atuei ou em atos nacionais como pegar na mão da Luiza (Trajano – CEO do Magazine Luiza) e dizer: vamos botar pra fazer! Empreender é muito mais que abrir uma porta larga e chamar de negócio, empreender é uma arte. Meu negócio é comercializar a mim mesmo e nisso ainda continuo muito bom.

Coisas da Vida: Você parou de ensinar. Desilusão?

Charles Borges: Pelo contrário, adoro ensinar. Mas chega um momento em que a docência toma muito da sua vida pela burocracia que a acompanha. Atualmente prefiro as palestras; não tem diário de classe nem provas para corrigir (risos). Mas o meu grau de maturidade profissional tende a seguir uma máxima muito comum na FIFA; existem os jogadores, árbitros e os fazedores de regras. Já atuei como jogador e como árbitro. Agora prefiro jogar com as regras.

Coisas da Vida: E 2012?
  
Charles Borges: Ah, sem esse clima de previsões, prefiro deixar as apostas para os videntes que às vezes erram e as vezes contam mais com a sorte do que a sorte em si. Quanto ao resto, o que é previsível nunca será previsível, sempre tem a teoria do caos e a lei de Murphy para fazer as coisas saírem diferentes do planejado. O resto é esperar para ver se os Maias apenas não tinham mais espaço para fazer seu calendário...


"Existem os jogadores, árbitros e os fazedores de regras. Já atuei como jogador e como árbitro. Agora prefiro jogar com as regras."

Entrevista realizada em 19/12/2011

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